Por Incra/RS
Os integrantes do quilombo Novo Horizonte, localizado às margens do Rio dos Caixões, em Jacuizinho (RS), estão oficialmente autorizados a ocupar toda a extensão de seu território étnico. Na quinta-feira (30), o Incra/RS foi imitido na posse dos últimos 154 hectares, de um total de 226, em processo de regularização fundiária. O Instituto recebeu o documento que assegura o direito de uso das terras na sede da associação comunitária, com presença das famílias e de autoridades locais.
A ação cumpre uma determinação da Justiça Federal de Cruz Alta, encaminhada para execução à comarca da Justiça Estadual de Salto do Jacuí. Conforme o chefe do setor de Quilombos do Incra/RS, Vitor Py Machado, que representou a autarquia na atividade, anteriormente o instituto havia sido imitido na posse de outras duas parcelas, de 46 e 27 hectares. Todas elas foram desocupadas de maneira consensual pelos detentores prévios.
O dirigente explica que, após uma etapa judicial de discussão sobre os valores (já depositados em juízo) com os antigos proprietários, os 226 hectares serão titulados em nome da associação quilombola. No entanto, os moradores já estão autorizados a usar os três perímetros conforme suas decisões coletivas.
“A gente têm uma terra onde botar a mão para trabalhar”, comemora Erocilda Santos, matriarca da comunidade. Na última safra, ela ajudou a comprar sementes para seus filhos, netos e bisnetos cultivarem milho, aipim, feijão, batata-doce e amendoim nas áreas já em posse do Incra. “E estão colhendo”, anima-se a agricultora.
Assim, o grupo deixa para trás o tempo em que “trabalhar de peão para os outros”, como relata Almeri, uma das filhas de Erocilda, era a única alternativa de sobrevivência disponível.
Ancestralidade comum
Anteriormente conhecida como Rincão dos Caixões, a comunidade Novo Horizonte possui laços de parentesco com os quilombos Júlio Borges, em Salto do Jacuí, e Linha Fão, em Arroio do Tigre. Este último era o local de origem de Erocilda, que migrou para Jacuizinho quando sua família foi pressionada a deixar as terras anteriormente ocupadas.
Por isso, a agricultora é uma referência entre os moradores, que compartilham formas de apropriação do território, baseadas no trabalho, na reciprocidade, na coletividade e em trajetórias comuns.
O grupo decidiu entrar com pedido de abertura do processo de regularização fundiária junto ao Incra em 2006, mesmo ano em que obteve a certidão de autorreconhecimento emitida pela Fundação Cultural Palmares
Em 2010, o Instituto publicou Portaria na qual reconheceu a comunidade e declarou os limites do território étnico. A área foi apontada com base no Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID), que teve estudos de caracterização social, histórica, antropológica e ambiental realizados em convênio com a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Dois anos mais tarde, a Presidência da República emitiu decreto declarando de interesse social os imóveis incidentes no perímetro, o que deu início aos procedimentos desapropriatórios, entre os quais, a propriedade de 154 hectares em cuja posse o Incra foi imitido nesta semana.
Avanços
Aliado ao processo de regularização fundiária, o ingresso nas políticas de apoio quilombola, possibilitou uma série de outros benefícios aos moradores da localidade de Novo Horizonte. Entre elas está a implantação de uma horta coletiva, com assistência da Emater, e a construção do centro comunitário equipado para beneficiamento de alimentos. É este espaço onde hoje acontecem celebrações e encontros de organização local. “Nossa maior festa é o dia da Consciência Negra. Vem gente dos outros quilombos para comemorar com a gente”, revela Andréa Silva, neta de Erocilda. Ela ainda comemora outra conquista. “Agora nossos filhos conseguem estudar”.
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Foto: Incra/RS