O capitalismo, segundo os pobres [também serve para ajudar a entender Trump]

Em tempos de disseminação da cartilha do capitalismo neoliberal, principalmente entre os jovens, pouco se fala, se escuta ou se questiona sobre o outro lado da história: os pobres. Uma dessas pessoas, a estadunidense Linda Tirado, em outubro de 2013, resolveu responder a um questionamento de um fórum na Internet: “Por que os pobres fazem coisas que parecem tão autodestrutivas?”. Abaixo, reproduzimos parte desta resposta, que acabou viralizando e sendo republicada por importantes veículos daquele país, como Huffington Post, Forbes e Nation.

No Voyager

Por que tomo decisões terríveis ou pensamentos sobre a pobreza

Não há maneira de estruturar isto coerentemente. São observações aleatórias que podem ajudar a explicar o processo mental. Mas, frequentemente, penso que vemos os problemas acadêmicos da pobreza e não temos ideia do porquê. Sabemos o porquê e como, e podemos perceber problemas sistêmicos, mas é raro ver uma pessoa pobre explicando isso por si própria. Então, eu meio que estou fazendo isso.

O descanso é um luxo para ricos. Acordo às 6h da manhã, vou à faculdade (tenho uma grade cheia, mas preciso ir apenas a duas aulas presenciais), depois trabalho, em seguida busco as crianças e meu marido, e finalmente tenho meia hora para trocar de roupa e ir para o segundo emprego. Chego em casa por volta de 0h30 e tenho que dar conta do restante das aulas. Vou para a cama às 3h. Não é assim todo dia — tenho dois dias de descanso por semana em cada uma de minhas obrigações. Uso esse tempo para limpar a casa e acalmar o Sr. Martini [seu marido], ficar com as crianças por mais de uma hora e fazer os trabalhos de faculdade.

Nessas noites, vou para a cama à meia-noite, mas se eu for para a cama cedo demais, não consigo ficar ligada nas noites seguintes porque vou foder meus padrões de sono. Dirijo 1h de casa para o segundo emprego e não posso correr o risco de ficar com sono. Nunca tiro um dia de folga do trabalho, a menos que esteja realmente doente. Isso não deixa muita margem para você pensar no que está fazendo, mas apenas cumprir a próxima tarefa e a seguinte. Planejar é impossível.

Quando fiquei grávida pela primeira vez, estava vivendo há algum tempo em um hotel de beira de estrada, de pagamento semanal. Havia um frigobar sem congelador e um micro-ondas. Eu estava cadastrada no WIC [ajuda nutricional financiada pelo governo para mulheres, bebês e crianças]. Comia manteiga de amendoim direto do pote e burritos congelados, porque 12 unidades custavam 2 dólares. Se eu tivesse um fogão, não conseguiria fazer burritos de carne tão baratos. Eu precisava da carne, pois estava grávida. Podia não ter assistência pré-natal, mas era inteligente o suficiente para comer proteína e ferro durante a gravidez.

Sei cozinhar. Precisei fazer economia doméstica para concluir o ensino médio. A maioria das pessoas ao meu redor, não. Brócolis é intimidador. Você precisa ter um fogão que funcione, panelas, temperos e ainda terá que lavar a louça, não importa quão cansada esteja, ou ela irá atrair insetos. É uma habilidade significativa para muitas pessoas. Não é legal, mas é assim. Se você vacilar, sua família pode ficar doente.

Aprendemos a não nos esforçar tão intensamente para chegar à classe média. Isso nunca dá certo e sempre faz você se sentir pior por ter tentado e fracassado de novo. Melhor não tentar. Faz mais sentido comprar alimentos que você sabe que serão palatáveis, baratos e que durem muito tempo. Junk food é o prazer que nos é permitido; por que abriríamos mão disso?

Temos muito poucos prazeres

A clínica de planejamento familiar mais próxima fica a 3h de distância. É muito dinheiro para gastar com gasolina. Muitas mulheres não podem bancar esse custo, e mesmo se você morar perto de uma clínica, provavelmente não vai querer ser vista indo e vindo em diversos lugares. Temos filhos exatamente pelos mesmos motivos que eu imagino que os ricos têm. Necessidade de procriação e tudo mais. Ninguém quer que os pobres procriem, mas julgam o aborto com ainda mais severidade.

Especialmente desde que o Patriot Act [que visa a fortalecer a segurança interna na “guerra contra o terrorismo”] foi aprovado, ficou difícil ter uma conta bancária. Porém, sem uma, você gasta um tempo enorme procurando onde descontar um cheque para pagar as contas. A maioria dos hotéis agora tem uma política de liberar um quarto apenas se você tiver um cartão de crédito. Uma vez, rodei São Francisco por cinco horas carregando mil dólares e não conseguia alugar um quarto nem se desse US$ 500 em espécie e deixasse meu celular como garantia.

Ninguém dá muita confiança para a depressão. Você precisa entender que nós sabemos que nunca deixaremos de nos sentir cansados. Nunca nos sentiremos esperançosos. Nunca tiraremos férias.

Nunca.

Sabemos que o próprio fato de sermos pobres garante que nunca deixaremos de ser pobres. Isso não nos dá motivo para melhorar nossos hábitos. Não nos candidatamos a empregos fixos porque sabemos que não conseguiremos bancar o custo de manter uma boa aparência para permanecer neles. Eu seria uma secretária super legal, mas fui rejeitada mais de uma vez porque eu não me encaixo na “imagem da firma”, que é uma maneira sutil de dizer “vaze daí, sua pobre”. Sou boa o suficiente para cozinhar, escondida na cozinha, mas meu chefe não me emprega porque eu não me encaixo na “imagem corporativa”. Não sou bonita. Tenho dentes faltando e uma pele que parece com a de quem passou a vida fumando, sem dormir, tomando vitamina B12 e café. Beleza é algo que você consegue quando tem dinheiro para bancar, e é assim que você consegue o emprego que precisa para ter dinheiro para ficar bonita. Não faz muito sentido tentar.

Cozinhar atrai baratas. Ninguém se dá conta disso. Gastei horas espetando baratas com palitos de dente para desencorajar as outras de entrar. Não funciona, mas é divertido.

“Grátis” existe apenas para os ricos. É legal ter um pote de camisinhas na minha faculdade, mas a maior parte dos pobres nunca colocará os pés em um campus universitário. Isso não nos pertence. Existe uma clínica? Ótimo! Mas ainda há uma coparticipação cobrada pelos planos de saúde. Não iremos. Além disso, tudo que te dirão na clínica é que você precisa se consultar com especialista, que… sério mesmo? Poderia também estar localizada em Marte, de tão acessível que é. “Baixo custo” e “escala móvel” soam como “dinheiro que você tem que gastar” para mim, e, de qualquer forma, eles não podem nos ajudar.

Eu fumo. É um hábito que custa caro, mas é a melhor opção. Sabe… estou sempre, sempre cansada. É um estimulante. Quando estou muito cansada para fazer mais alguma coisa que esteja faltando, posso fumar para aguentar mais uma hora. Quando estou com raiva e abatida, incapaz de cumprir uma tarefa, posso fumar e me sentir um pouco melhor, só por um minuto. É o único relaxamento que me é permitido. Não é uma boa decisão, mas é a única à qual tenho acesso. É a única coisa que descobri que me impede de entrar em colapso ou explodir.

Tomo muitas decisões financeiras ruins. Nenhuma delas importa a longo prazo. Nunca deixarei de ser pobre, então o que importa se eu deixar de pagar duas contas em vez de uma? É improvável que o sacrifício melhore minhas circunstâncias; o que me puxa para trás não são os 5 dólares por hora que ganho na Wendy’s [cadeia de restaurantes dos EUA]. O que me puxa é que provei que sou uma pessoa pobre e sempre serei. Para mim, não vale a pena viver uma vida austera e privada de pequenos prazeres para que, um dia, possa fazer uma grande aquisição. Nunca terei grandes prazeres.

Existe um certo anseio de querer viver os pequenos pedacinhos que há de vida enquanto você não tem dinheiro na carteira. Porque, não importa o quanto você seja responsável, de qualquer forma estará sem dinheiro de novo em três dias. Quando você nunca tem dinheiro o suficiente, isso deixa de ter significado. Imagino que ter muito dinheiro seja a mesma coisa.

A pobreza é sombria e consome seu pensamento de longo prazo. É por isso que você vê pessoas com filhos de quatro pais diferentes em vez de apenas um. Você procura um vínculo em todo lugar que puder para sobreviver. Você não tem ideia de como é forte o desejo de sentir que é alguém que vale a pena. É mais essencial que alimento. Você procura essas pessoas que fazem você se sentir adorável naquela uma hora e isso é tudo que tem. Você provavelmente não é compatível com aquela pessoa para qualquer relacionamento mais duradouro, mas nesse exato minuto ela pode fazer você se sentir uma pessoa poderosa e valiosa. Não importa o que vai acontecer daqui a um mês. Qualquer coisa que acontecer daqui a um mês provavelmente não será diferente do que aconteceu hoje ou semana passada. Não importa. Não fazemos planejamento de longo prazo, porque, se fizermos isso, apenas partiremos nossos corações. É melhor não ter esperanças. Você só consegue aquilo que pode, assim que o vê.

Não estou pedindo empatia. Estou apenas tentando explicar, em uma perspectiva humana, como é que as pessoas tomam o que parecem ser péssimas decisões para quem está do lado de fora. É assim que são nossas vidas, nossos mecanismos de defesa e por que pensamos de maneira diferente. Certamente, é autodestrutivo, mas é mais seguro. É isso. Espero que ajude a fazer sentido.

Trabalhando por salário mínimo

Trabalhar e receber salário mínimo significa que planejar o orçamento de longo prazo é um exercício de ansiedade. Você tem dinheiro somente até que ele acabe, e paga as contas mais atrasadas primeiro. Quando trabalhava em Ohio, em um fast food, geralmente fazia 25 horas por semana. O valor da hora era US$ 7,50, o que dava US$ 187,50.

Meu marido, trabalhando 40 horas por semana no mesmo lugar, trazia para casa US$ 300. Fizemos um total de cerca de US$ 25 mil, trabalhando em todas as semanas do ano. Isso é cerca de US$ 9 mil acima da linha da pobreza para uma família de duas pessoas, ou um extra de cerca de US$ 200 por semana. Honramos as despesas, mas por pouco. Não o suficiente para ficar confortável, descansar ou tirar um dia de folga sem sentir culpa. E estávamos no topo do terço das famílias mais pobres naquele ano, o que significa que aproximadamente um terço da população dos Estados Unidos está vivendo com orçamento semelhante. Ou, para alguns, um muito menor. A renda anual de alguém que trabalha 40h por semana por salário mínimo é US$ 15.080. Portanto, se você gasta metade disso com habitação, sobram US$ 7.540 para viver. Por ano.

São US$ 628 por mês ou US$ 314 por pagamento, para todo o resto — comida, roupa, prestação do carro, gasolina. Se você tem sorte, consegue viver com esse dinheiro. Mas quem tem sorte todo o tempo ou na maior parte dele? Você pode adoecer e perder o emprego. Mesmo que consiga um novo emprego, aqueles míseros 314 dólares são tudo que tem até que comece a receber o salário no novo emprego. E se, Deus nos livre, o carro quebrar ou você quebrar uma perna?

Tudo se resume a isto: a matemática não fecha. Você não pode ter uma vida próspera com esse tipo de remuneração. Ponto. Você sobrevive. É isso.

Trabalho temporário

Existe algo pior do que salário mínimo. Chama-se trabalho temporário. Aposto que a maioria das pessoas — a menos que tenham vivenciado isso — ficaria chocada ao descobrir que empresas contratam regularmente profissionais temporários em período integral, mas, como contratam por meio de agências de emprego temporário, não precisam oferecer benefícios e condições de segurança do trabalho. Elas fazem isso porque é mais barato do que contratar trabalho diretamente e a lei permite. As leis nos Estados Unidos são tão fracas que estamos muito atrás da Coreia do Sul (!) na proteção de trabalhadores temporários.

Quando pessoas em situação financeira confortável, plano de saúde, licença por doença e todos os tipos de benefício que recheiam suas carteiras e tornam suas vidas mais fáceis e saudáveis pensam que pobres são pobres porque não nos esforçamos para mudar nossa situação… bem, não sei se minha reação é publicável.

Uma fábrica perto de onde eu morava contratava um número rotativo de trabalhadores temporários que eram demitidos após 90 dias — período no qual o trabalhador temporário adquire o status de trabalhador permanente. Depois de três semanas desempregados, a fábrica os contratava novamente.
A fábrica não está mais na cidade. Ela havia conseguido um acordo com o governo local, tornando os primeiros anos ali livres de impostos.

Com o término da isenção, a empresa dona da fábrica decidiu que aquela planta não era lucrativa o suficiente e encerrou suas atividades. Uma fábrica temporária que contratava trabalhadores temporários.

Quem disse que o capitalismo não é cruel?

Sobre não ter segurança no trabalho e ser demitida

Sabemos que muita gente acha que pobres são preguiçosos e incompetentes. Eles acham que somos demitidos dos empregos porque não sabemos como nos comportar, chegamos sempre atrasados ou simplesmente não estamos nem aí. Mas o que os ricos não percebem é o quão inacreditavelmente fácil é ser demitido. E, muitas vezes, o que causa sua demissão é o fato de estar trabalhando em mais de um emprego.

Sempre que está trabalhando para o perfil de empresa que tem um escritório central, dão para você a menor quantidade possível de horas para trabalhar — definitivamente menos que período integral, porque teriam que lhe pagar benefícios. Mas, mesmo que seu empregador o escale para 20 horas semanais, você acaba trabalhando 10 ou 30. Depende da demanda — quando está tudo calmo, o mandam para casa e, quando está apertado, esperam que fique até mais tarde. Também esperam que esteja apto a comparecer para cobrir a ausência de um colega de trabalho se ele adoecer de repente. Basicamente, esperam que esteja disponível para trabalhar o tempo todo. Escala de trabalho é algo impossível.

Em uma cadeia de restaurantes, eu era obrigada a assinar um contrato afirmando que era uma funcionária sob demanda [em inglês, at-will,modalidade de trabalho em que o empregador não precisa de justificativa para demitir o funcionário], que trabalharia em tempo parcial e sem benefícios, e que se eu arrumasse outro emprego sem permissão estaria sujeita à demissão, porque a empresa esperava que eu estivesse disponível para comparecer ao trabalho sempre que fosse necessário.

E, sim, isso é legal.

Vamos analisar: você é pobre, então precisa de qualquer trabalho capenga que encontrar, e a natureza do trabalho capenga é que você pode ser demitido a qualquer momento. Enquanto isso, sua carga horária pode ser reduzida sem aviso prévio, e não há obrigação por parte do empregador de pagar indenização, independentemente de por que, quando e como ele o dispensou. E a gente se pergunta por que os pobres ficam mais pobres?

Não se sentir valorizada

Uma vez que estou em casa, após o trabalho, tento não ser mal-humorada com meu marido, que, definitivamente, não é o culpado por meu mau humor. Ele, por sua vez, tenta não ter pavio curto comigo. Trabalhar em empregos de baixa remuneração implica sair do trabalho e ter energia mental apenas para imaginar o que poderia estar fazendo com sua vida… se somente você pudesse trabalhar o desejo de sair do lugar.

Honestamente, não me importaria com as degradações oriundas do meu trabalho se os privilegiados e poderosos fossem honestos a respeito disso. Se admitissem que isso é simplesmente impossível.

Em vez disso, nos dizem para nos esforçar mais e ser gratos por ter emprego, comida e teto. Pelo amor de Deus, nós somos. Mas em troca de todo esse trabalho que estamos fazendo, e nossas condições de trabalho miseráveis, não estamos autorizados a exigir nada em troca. Nenhum sentimento de realização, respeito dos superiores ou a segurança do emprego. Espera-se que a gente não se sinta com direito a essas coisas. Ser pobre enquanto se trabalha pesado é foda. É viver em um pesadelo em que as paredes não param de se fechar em torno de você.

Fico com raiva toda vez que minha escala é cortada e depois sou chamada para cumprir toneladas de horas-extras, como se meu tempo não valesse nada, tanto que meu chefe pode se certificar em não me pagar por um minuto em que eu não seja absolutamente necessária.

Fico com raiva por ter que abdicar da possibilidade de ter um segundo emprego e me dizerem que também não posso trabalhar mais de 28 horas por semana.

Qual é o resultado de tudo isso? Simplesmente desisti de me importar com o trabalho. Perco a energia, a vivacidade, a vontade. Executo as coisas conforme orientado, mas não mais que isso. Foram raras as vezes que tive um chefe que me deu qualquer indício de que me valorizava mais do que meu uniforme — éramos descartáveis nesse nível — , então também não faço um esforço adicional pelos meus chefes. O problema não é apenas ser subvalorizada — o sentimento é que as pessoas se esforçam sobremaneira para ter a certeza de que você saiba quão inútil é.

Estava trabalhando para uma empresa há mais de um ano quando me acidentei no trabalho, em novembro, e tive que me ausentar por dois meses, porque não conseguia ficar de pé por muito tempo. Como consequência, não fui convidada para a festa de Natal da empresa. Fui como namorada de um colega e apenas observava enquanto todos recebiam seus bônus de Natal. Não recebi. Não estava tecnicamente em posição gerencial, portanto, não estava qualificada a receber. O fato de eu ter trabalhado o resto do ano não contava.

O que realmente me afetou, porém, foi quando o dono da empresa agradeceu a mulher que me substituiu por ter trabalhado tão duro todo o ano. Ele não me reconheceu.

Estágios não remunerados

Outra coisa que não está ao alcance do pobre são os estágios não remunerados. Tive que recusar ofertas que melhorariam minha condição de vida a longo prazo porque, simplesmente, não poderia trabalhar de graça. Mais uma vez, as pessoas que podem fazer estágios não remunerados recebem ajuda de casa — no meu mundo, todos têm que trabalhar para viver. Isso significa que também estamos sendo privados de todo o networking em potencial. Essa é, pelo menos, uma razão pela qual eu meio que nunca tive uma rede de contatos profissionais: nunca tive a chance de construir uma. Aceitar um estágio não remunerado ou um desses que pagam apenas o valor do almoço é para pessoas que não têm que pagar contas.

Por estar sempre em uma situação de ter apenas aquilo que posso conseguir imediatamente, sempre acabo em trabalhos que as pessoas consideram abaixo delas. E as pessoas ainda se perguntam por que nós, trabalhando na base da pirâmide, não colocamos nossa alma em nossos trabalhos.

Em vez disso, fico pensando a respeito de pessoas que pensam que pobres não deveriam exigir reciprocidade por parte de seus empregadores. Devemos nos dedicar a algo que não nos beneficia mais do que o absolutamente necessário? Temos que nos preocupar com seus interesses, mas eles não têm que se preocupar com os nossos? Se você vai gastar o mínimo possível com meu treinamento e salário, se vai se certificar de que eu não trabalhe horas o suficiente para sobreviver, de modo a evitar ter que pagar um plano de saúde, e, geralmente, se certificar de que estou tão desconfortável quanto possível, a qualquer momento, para saber qual é meu lugar, como pode esperar que eu me importe com sua margem de lucro?

Lembre-se, você recebe aquilo que paga para fazerem.

Cigarro

Cada um lida com as dificuldades a sua maneira. Eu fumo. Minha amiga bebe. De fato, aposto que muitos de seus amigos também lidam com os problemas bebendo. Ao chegar de um longo dia de trabalho, o que você faz? Abre uma cerveja? Ou um pacote de batatinhas? Ou toma um Valium, quando se sente estressado. Ou pede uma massagem. Ou vai para a academia e pega uma sauna.

Por que os mecanismos de enfrentamento de outras pessoas são melhores do que os dos pobres? Porque eles são mais bonitos. Pessoas com mais dinheiro bebem vinhos melhores, em taças mais pomposas. Talvez recebam prescrição de benzodiazepínicos de seus psiquiatras particulares, a quem basta fazer um telefonema, em vez de comprar um maço de cigarro. Eles podem comprar o que quiserem e está tudo certo, porque terapia de varejo é um tratamento reconhecido pelas classes mais altas. Pobres não têm esses luxos. Fumamos porque é uma descarga de dopamina barata e rápida. E drogas são produzidas porque é uma maneira eficaz de se sentir bem ou fugir de algo.

Eu compreendo que mecanismos de enfrentamento dos pobres não são fofinhos. Eu realmente compreendo. O que não entendo é por que outras pessoas se sentem tão livres em julgá-los. Como se nossos comportamentos autodestrutivos justificassem, portanto, nossas vidas de merda.

Surpresa: isso é bidirecional. Às vezes, os hábitos são uma reação à situação.

A menos que você esteja preparado para me convencer de que fumar é a única razão que me mantém pobre, por favor, poupe-me do sermão. Sei que é ruim para mim. Sou viciada, mas lúcida.

Este texto foi traduzido com permissão da autora e é parte de seu livro, Hand to Mouth. Visto originalmente no Guardian.

Tradução: Edson Cunha

Revisão: Viviane Gonçalves e Matheus Rocha

Linda Tirado. Foto: Scott Schuman

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