“X-Week” no Studio-X Rio debateu escala local vs. grande nas soluções para água e esgoto

Consenso era usar novas iniciativas sustentáveis e mecanismos de baixo para cima

Lisa Godde – RioOnWatch

De 9 a 14 de março, o Studio-X Rio sediou a x-Week (Semana X) como parte das comemorações do seu sexto aniversário. Organizada em parceria com o Columbia Global Centers (Centros Global Columbia)–que comemora o seu quarto aniversário–o Museu do Amanhã e a Prefeitura do Rio de Janeiro, os eventos do Studio-X focaram nos tópicos de água e habitação. Especialistas do Brasil e do exterior participaram dos debates, exposições, mesas redondas e de uma visita guiada.

A Semana X 2017 começou na quinta-feira com apresentações e um debate sobre tecnologia alternativa sustentável para tratamento de águas residuais, com a participação de planejadores urbanos, arquitetos e engenheiros nacionais e internacionais.

O esgoto e as águas residuais são um grande problema no estado do Rio com apenas 65% sendo coletado e cerca de 34% tratado, causando uma variedade de problemas de saúde, poluição ambiental e enchentes. Além disso, investir na estrutura do saneamento é economicamente eficiente pois cada R$1 investido resulta em R$4 poupados no setor da saúde.

Ooze Architects, uma dupla baseada em Roterdã composta por Eva Pfannes e Sylvain Hartenberg–apresentou um projeto de pântano construído, “Água Carioca“.  A natureza abundante do Rio, como Eva explicou, torna-o um lugar ideal para limpar o esgoto por meio das plantas. Ela contestou a ideia comum de que o esgoto precisa ser escondido e ficar no subsolo, argumentando que “o esgoto deveria estar perto de nós para entendermos como funciona”.

Imitando o corpo humano e o seu ciclo de limpeza, os filtros orgânicos usam micro-organismos naturais para tratar a água e assim evitar completamente o uso de produtos químicos. Eva explicou que o ponto forte dos projetos em pequena escala é o seu foco no local, adaptando-se melhor ao contexto do que os projetos em grande escala.

Isaac Volschan Junior, um engenheiro civil, especialista em saneamento e professor do Departamento de Recursos Hídricos e Meio Ambiente da UFRJ, acrescentou que apesar de algumas tecnologias em grande escala serem sustentáveis, nem sempre são aplicáveis. Assim, ele reforçou a mensagem de Eva que preconiza o uso de infraestrutura local descentralizada, o que foi um tópico comum das discussões.

Referindo-se ao título do evento–Saneamento Básico: Novas Tecnologias, Aplicabilidade e Planejamento Urbano–Isaac questionou o uso de “nova” infraestrutura alternativa no contexto do Rio que, conforme argumentou, ainda não tem a infraestrutura básica de saneamento “antiga”. Ele argumentou que o Brasil já tem dificuldade em implantar o saneamento mais básico para grande parte da população, portanto pensar em tecnologias alternativas é irrealista. Ele também explicou que para uma tecnologia funcionar em um certo contexto, é necessário haver um forte sistema de regularização, e considerar a sustentabilidade econômica, a eficácia e a “robustez” da manutenção e da operação.

Ao contar sobre a sua primeira visita a uma favela no Rio, Kartik Chandran, um engenheiro ambiental da Escola de Engenharia e Ciências Aplicadas de Columbia, salientou como as comunidades encontram as suas próprias soluções para o abastecimento de água, e que estas oportunidades não devem ser ignoradas. Raramente discutida, muita infraestrutura envolve um grande impacto dos gases de efeito estufa no ambiente e os sistemas locais podem ser uma alternativa menos cara e mais adequada. Na Universidade de Columbia, Kartik e os seus alunos pesquisam o potencial do esgoto para ser transformado em outros recursos, como alimentos e calor. Deste modo, os impactos dos gases de efeito estufa são consideravelmente reduzidos e outros recursos são obtidos.

Durante o debate que se seguiu, a promoção dos projetos sustentáveis nas comunidades foi percebida como um início promissor para o desenvolvimento de infraestrutura mais sustentável e viável. A suposição previamente colocada por Isaac, da necessidade de instalar saneamento básico antes de atualizá-lo para tecnologias mais novas e sustentáveis, foi contestada por José Luis Vallejo, professor na Escola de Graduação de Arquitetura, Planejamento e Preservação de Columbia e membro fundador do ecossistema urbano, um grupo de arquitetos e projetistas urbanos baseado em Madrid que trabalha na área de urbanismo. Ele perguntou: “Porque devemos usar tecnologias antigas se conhecemos tecnologias novas e mais eficientes?”

Projetos alternativos como Água Carioca do OOZE podem apoiar-se na motivação e organização encontradas em muitas comunidades locais, como o Morro da Formiga, onde a informalidade da comunidade pode ser uma oportunidade. Contrastando com áreas mais formais da cidade, os moradores das favelas identificam-se muito mais com a sua comunidade e participam com mais frequência da implantação de projetos locais. Além disso, como as fossas sépticas e a captação de água são separadas para cada casa, as famílias tornam-se responsáveis pela manutenção do sistema, assegurando o conhecimento do processo. Em favelas bem organizadas como a Formiga, um projeto como Água Carioca pode ser sustentável durante anos.

No sábado, os participantes puderam ter uma ideia melhor dos filtros orgânicos durante uma visita guiada ao protótipo Água Carioca no Sítio Roberto Burle Marx um patrimônio cultural brasileiro com mais de 3500 espécies diferentes de plantas. Lançado como parte de um extenso estudo sobre o uso dos pântanos para filtrar as águas residuais, o protótipo utiliza algumas dessas plantas.

Ao contrário do que a ideia de um “pântano construído” possa sugerir, os filtros orgânicos não envolvem água parada na superfície, evitando assim quaisquer problemas com mosquitos ou cheiro. Além disso, se for implantado em uma favela local, este sistema fornece mais espaço público e poderia ajudar a limitar a densificação da população.

Refletindo sobre um tema subjacente de vários dos seus eventos, a Semana X também apresentou uma mesa redonda sobre iniciativas de baixo para cima. Este projetos consideram a participação ativa dos cidadãos fundamental para fortalecer as comunidades para abordagens mais sustentáveis.

Além de uma exposição e debate sobre o que constitui uma boa habitação pública, a Semana X 2017 concluiu com a abertura da exposição “Infraestruturas residenciais híbridas”. Seguiu-se uma mesa redonda sobre o desafio da habitação com arquitetos do MMBB, H+F, Vigliecca & Associados e Cité Arquitetura.

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