CNDH divulga nota em repúdio ao parecer anti-indígena da AGU sobre o marco temporal

Cimi

O Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH) aprovou, nesta quarta-feira (27), uma nota pública de repúdio ao Parecer 01 da Advocacia-Geral da União (AGU), que obriga a administração pública federal a aplicar, a todas as #TerrasIndígenas do país, condicionantes que o Supremo Tribunal Federal estabeleceu, em 2009, para a Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima.

O posicionamento, aprovado na 30ª Reunião Ordinária do colegiado, realizada nestes 27 e 28 de setembro, foi entregue  em mãos à procuradora-geral da República, Raquel Dodge, que participou da sessão nesta quinta (28) na parte da manhã.

“A manifestação deste Conselho se dá por solicitação reiterada dos povos indígenas do Brasil que vivem sob permanente ameaça e violência, ainda mais agravada com a insegurança causada pela ação do agronegócio e sua bancada ruralista, pela paralisação e retrocessos nos processos de demarcações das terras indígenas pelo Governo Federal que descumpre e ignora direitos garantidos na Constituição Federal”, diz a nota.

Para o #CNDH, todas essas violações encontram respaldo no Parecer da AGU, que inclusive foi utilizado para anular, por meio da Portaria MJ 683/17, a Portaria MJ 581/15, que reconhece a posse permanente do povo Guarani na Terra Indígena Jaraguá.

Leia a nota na íntegra:

NOTA PÚBLICA DE REPÚDIO AO PARECER 01/2017 DA AGU QUE VIOLA O DIREITO DOS POVOS INDÍGENAS AOS SEUS TERRITÓRIOS

O Conselho Nacional dos Direitos Humanos – CNDH, órgão autônomo criado pela Lei nº 12.986/2014, vem a público repudiar o Parecer 01 da Advocacia Geral da União (AGU) que obriga a administração pública federal a aplicar, a todas as terras indígenas do país, condicionantes que o Supremo Tribunal Federal (STF) estabeleceu, em 2009, especificamente para a Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima.

A manifestação deste Conselho se dá por solicitação reiterada dos povos indígenas do Brasil que vivem sob permanente ameaça e violência, ainda mais agravada com a insegurança causada pela ação do agronegócio e sua bancada ruralista, pela paralisação e retrocessos nos processos de demarcações das terras indígenas pelo Governo Federal que descumpre e ignora direitos garantidos na Constituição Federal. Todas essas violações encontram respaldo no parecer da AGU, que inclusive foi utilizado para anular, por meio da Portaria MJ 683/17, a Portaria MJ 581/15, que reconhece a posse permanente do povo Guarani na Terra Indígena Jaraguá.

A Advocacia Geral da União emitiu Parecer, o qual foi aprovado pelo Presidente da República, tendo como finalidade a regulamentação de procedimento de demarcação de terras indígenas. A fundamentação contida no estudo é essencialmente retirada da Pet. 3388/RR e de dois julgados da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal.

Ocorre que, as decisões da Segunda Turma do STF se dobraram diante da posição do Pleno da Corte no julgado das ACOs 366 e 362, de origem do Mato Grosso, onde parte da discussão se deu em torno da tradicionalidade da ocupação indígena.

Na contramão da vontade do constituinte originário e do que está previsto na Carta de 1988, o Parecer retira pequenos trechos do caso Raposa Serra do Sol (Pet. 388/RR), mas que são excertos nocivos e selecionados minuciosamente com o intuito de impedir a continuidade dos processos de demarcação das terras indígenas. O direito constitucional indígena, contudo, é muito mais que apenas duas teses mal interpretadas e inconstitucionais.

As teses do marco temporal e de impedimento de revisão de limites de terras indígenas, contidas no Parecer, são passagem isoladas do julgado na Pet. 3388/RR e destoam do Art. 231 da CF/88 e da vontade do constituinte originário.

O impacto do parecer da AGU é a retirada da tradicionalidade da posse indígena, diminuindo o alcance do direito constitucional indígena para apenas posse física. Acima de tudo, posse física datada da promulgação da Constituição de 1988, o que é um escárnio com o texto constitucional, com o processo de violência e expulsões de seus territórios sofridos pelos povos indígenas, e com os recentes julgados da Suprema Corte, especificamente aquele relativo aos Embargos de Declaração na Pet. 3388, onde se afirmou que as condicionantes estabelecidas eram pertinentes exclusivamente à Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Viola ainda os tratados internacionais ratificados pelo Brasil, em especial a Convenção 169 da OIT, o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, e o Pacto de San José, bem como a jurisprudência internacional.

Portanto, o Parecer nº 01 da AGU afronta a Constituição Federal 1988, viola o princípio do não retrocesso e os direitos dos povos indígenas do Brasil, o que não se pode admitir. Por tais motivos, o CNDH se manifesta pela revogação do Parecer 01/17 da AGU e da Portaria nº 683/17 e pela retomada imediata da demarcação das terras indígenas.

Brasília, 27 de setembro de 2017.

CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS HUMANOS – CNDH

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