A Rosa do STF

por Juremir Machado da Silva, em Correio do Povo

Diz-se, desde muito tempo, que uma rosa é uma rosa e que a rosa não tem porquê. Diz-se também que cada rosa exala o perfume que rouba dos nossos jardins. Resta saber se há coerência na rosa que desabrocha sob os holofotes. Será que ela se contradiz para satisfazer seus admiradores? A Rosa do STF declarou ser favorável à presunção de inocência até o trânsito em julgado como consta no inciso LVII do artigo 5º da Constituição Federal. Mas votou, quando do julgamento do espinhoso Habeas Corpus do ex-presidente Lula, contra a sua convicção por desejo de coerência com a jurisprudência adotada pelo colegiado em 2016, ou seja, a prisão depois da condenação em segunda instância.

A Rosa que floresce em Brasília afirmou que se dobrava à regra do jogo em vigor mesmo não concordando com ela. Acontece que, como circula em sites especializados em assuntos jurídicos, cerca de 15 dias antes do seu voto, que abriu caminho para a prisão de Lula, ela votou, em outro HC, numa decisão monocrática, solitária, de maneira oposta. Justificou-se desta maneira: “Às fls. 3.056-62, o Ministério Público Eleitoral requereu o imediato cumprimento do início da pena, com a expedição da respectiva guia de execução, pelo que determinei fosse aguardado o desfecho da controvérsia no Supremo Tribunal Federal, diante do ajuizamento das ações declaratórias de constitucionalidade 43 e 44, sem prejuízo da regular tramitação do recurso no TSE. É o relatório. Decido”. Qual é a rosa que vale?

Talvez se saiba quando o ministro Marco Aurélio Melo cumprir a promessa de bater na mesa para forçar o julgamento das tais ADCs citadas no despacho de Rosa Weber para não determinar a prisão dos “pacientes” do Rio Grande do Norte que pediram para não ser presos antes do trânsito em julgado e foram por ela atendido. Por que Rosa votou de um jeito em 20 de março e de outro em 4 de abril? As rosas não têm porquê. As decisões de justiça sempre se baseiam em alguma particularidade que os jardineiros comuns desconhecem e não compreendem. As contradições são chamadas de interpretações fáticas. As conveniências são envoltas em considerações jurídicas herméticas e pomposas.

Uma rosa é uma rosa e não pode ser confundida com o roseiral. Cada rosa é única, embora, como num holograma, represente as rosas do seu universo. Uma rosa está no roseiral assim com o roseiral está na rosa. O STF transformou-se num campo de guerra. Nele, a Rosa pode se despedaçar e ser levada pelos ventos e temporais. A tese do aparelhamento desabou. Ministros indicados por José Sarney, Fernando Collor e FHC defendem as pretensões de Lula. Cinco dos sete indicados por Lula e Dilma votaram contra os interesses do ex-presidente. Rosa ficou dividida. Uma pétala para cada lado. Um voto para cada paciente. O que fará hoje: mal me quer, bem me quer, hoje voto com você?

O voto destoante da Rosa, entre mais de 50 com o perfume da “colegialidade”, não ganhou destaque na grande mídia, assim como foi praticamente ignorado o áudio com uma voz pedindo que Lula fosse jogado pela janela do avião que o levava para a prisão em Curitiba. O jurista Lenio Streck, na sua coluna no site Conjur, espantou-se: “A ministra Rosa Weber fez no recurso eleitoral o oposto do que fez no HC de Lula, com pouco mais de dez dias de diferença entre as decisões”. Por quê?

No país das conveniências, o PEN, que contratara o advogado mais caro e midiático do país, para derrubar a prisão em segunda instância, mudou de ideia. Se Lula está preso, o trânsito em julgado não interessa mais. Cada rosa tem seu perfume e sua hora de desabrochar. Alguma pode ser colocado sobre a lápide da Constituição. Mas aí já fica dramático demais. O STF está mais para tragicomédia.

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