MPF no Rio de Janeiro entra com ação contra misoginia na rede Facebook

Ação pede retirada de comentários discriminatórios e medidas de promoção da igualdade de gênero

O Ministério Público Federal (MPF) no Rio de Janeiro entrou com ação civil pública contra a empresa Facebook Serviços Online do Brasil, responsável no país pela mídia social Facebook, em razão da manutenção de diversos comentários discriminatórios contra as mulheres em página do serviço. A ação, proposta pela Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão, pede, além da retirada dos comentários ofensivos, a adoção de providências voltadas a cumprir as Convenções da ONU.

Os conteúdos discriminatórios identificados pelo MPF foram postados em resposta à enquete lançada por um usuário do serviço, indagando a idade em que as mulheres teriam “perdido a virgindade”. A empresa foi oficiada formalmente a se manifestar sobre a manutenção das publicações, e afirmou que “contatou os operadores do site Facebook (…) os quais afirmaram que os conteúdos e respectivos comentários não violam os Termos de Serviço e Padrões de Comunidade do Facebook, razão pela qual estão ativos na plataforma e não foram adotadas providências administrativas em relação a eles (…)”.

Dentre os conteúdos identificados como discriminatórios encontram-se os seguintes: “Mulher hoje tá igual seriguela. Difícil achar uma no ponto que já não esteja bichada”; “Mundo transformou elas em vagabundas em troca de ‘liberdade’; “Por isso que mulher não vale nenhum sacrifício do homem, elas que se sacrifiquem por nós”; “E o pior é que a maioria delas consegue um Zé Ruela para servir de hospedeiro… Eternas parasitas”; “Mulheres assim estão em todos os lugares a cada esquina e quiçá ganhando espaço na mídia”; “Pqp, eis que você ainda procura a mulher honrada?”

A ação do MPF argumenta que tais comentários, “mantidos com o conhecimento e consentimento da empresa”, violam dispositivos das Convenções da ONU sobre a eliminação de todas as formas de discriminação contra a mulher (1979), e da OEA, para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher (“Convenção De Belém Do Pará”, 1994).

Nos termos do artigo 1º da Convenção da ONU, considera-se discriminação contra a mulher “toda a distinção baseada no sexo que tenha por objeto ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício pela mulher dos direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural e civil ou em qualquer outro campo”.

Segundo a mesma Convenção, compete aos Estados que assinaram o tratado “tomar as medidas apropriadas para eliminar a discriminação contra a mulher praticada por qualquer pessoa, organização ou empresa”, inclusive no que se refere à “modificação dos padrões socioculturais de conduta de homens e mulheres, com vistas a alcançar a eliminação dos preconceitos e práticas consuetudinárias e de qualquer outra índole que estejam baseados na ideia da inferioridade ou superioridade de qualquer dos sexos ou em funções estereotipadas de homens e mulheres”.

A Convenção de Belém do Pará, por sua vez, garante o direito da mulher “a ser livre de todas as formas de discriminação”; e “a ser valorizada e educada livre de padrões estereotipados de comportamento e costumes sociais e culturais baseados em conceitos de inferioridade ou subordinação”.

Na ação, o MPF pede, com fundamento na Lei do Marco Civil da Internet (Lei 12.965/14), que a Justiça Federal determine à empresa a remoção do conteúdo ilícito, e também o atendimento das seguintes medidas: a) modificar seus regulamentos vigentes no território brasileiro e práticas consuetudinárias que respaldam a persistência e a tolerância da violência contra a mulher em conteúdos postados por brasileiros ou em território nacional, no serviço Facebook; b) estabelecer mecanismos internos necessários para assegurar que a mulher sujeitada a violência cometida por meio do serviço Facebook em território nacional seja rapidamente assistida pela empresa Ré; c) adotar medidas específicas, inclusive programas destinados a promover o conhecimento e a observância do direito da mulher a uma vida livre de violência e o direito da mulher a que se respeitem e protejam seus direitos humanos; d) desenvolver campanhas voltadas a combater preconceitos e costumes e todas as outras práticas baseadas na premissa da inferioridade ou superioridade de qualquer dos gêneros ou nos papéis estereotipados para o homem e a mulher, que legitimem ou exacerbem a violência contra a mulher.

Íntegra da petição inicial

Referência: ACP n 503870631.2019.4.02.5101

Assessoria de Comunicação Social
Procuradoria da República no Rio de Janeiro

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