País tem queda de nível “médio” para “baixo” e é criticado por ausência de políticas mais efetivas em relação ao clima, bem como pelos cortes governamentais em instituições. Em ritmo lento, energia renovável cresce.
Enquanto líderes mundiais discutem o futuro do planeta na 27ª Conferência do Clima da ONU (COP27), em Sharm el-Sheikh, no Egito, o mais recente Índice de Desempenho em Mudança Climática (CCPI) aponta que o Brasil caiu cinco posições no relatório de 2022, caindo da 33ª posição para a 38ª.
O levantamento, publicado anualmente pelas ONGs ambientais Germanwatch e New Climate Institute, além da rede Climate Action Work, avalia as medidas de proteção climática da União Européia e de outros 59 países, que, juntos, são responsáveis por mais de 90% das emissões de gases de efeito estufa em todo o mundo.
Conforme o estudo, o Brasil “mostra um desempenho misto nas categorias do CCPI, com classificações altas para Energia Renovável e Consumo de Energia, mas baixa para Emissões de GEE [gases de efeito estufa] e muito baixa para Política Climática”. O relatório critica o fato de que “instituições que desempenham um papel importante na política ambiental têm sofrido ataques e cortes de financiamento desde que o presidente [Jair Bolsonaro] assumiu o poder, em 2019”.
Especialistas responsáveis pelo CCPI mostram-se preocupados também com o atual aumento do uso de combustíveis fósseis no país, tendência que se intensificou a partir da crise energética causada pela invasão russa da Ucrânia.
A crise mostra como os países ainda são dependentes de combustíveis fósseis, apontam os autores do relatório. No entanto, as energias renováveis geram mais custos-benefícios do que centrais de energia convencionais recém-construídas, e os investimentos em eficiência energética nunca deram tantos resultados como hoje em dia.
“A crise energética mostra que as reduções [em relação às mudanças] climáticas ambiciosas são o caminho mais razoável para se avançar economicamente”, diz Niklas Höhne, fundador do New Climate Institute.
O relatório do CCPI também aponta que o Brasil está entre as 20 nações com as maiores reservas de petróleo do mundo e que o país planeja aumentar a produção de gás natural e carvão mineral em mais de 5% até 2030.
Segundo os cientistas, essa possível iniciativa seria incompatível com as metas do Acordo de Paris, estabelecido em 2015, no qual diversos países se comprometeram a reduzir as emissões de gases para que a temperatura média do planeta diminua 1,5°C e retorne a patamares do período pré-industrial, no início do século 19.
Desmatamento e energias renováveis
O levantamento informa que apesar de o Brasil ter um plano para extinguir o desmatamento ilegal, a prática tem aumentado e atingido recordes desde 2006, juntamente com incêndios na Amazônia e no Cerrado. Por isso, o relatório acusa o Brasil de ter políticas “frequentemente subfinanciadas e mal aplicadas”.
Os especialistas concluíram que houve aumento da participação brasileira em energias renováveis, como a eólica e a solar, ainda que em ritmo mais lento do que em outros anos. Além disso, chegou-se a esse resultado através de violações de direitos humanos contra populações locais e grupos indígenas.
O CCPI também destaca que o Brasil ainda é muito dependente da energia hidrelétrica, que é vulnerável às secas, acarretando o risco de um aumento do uso de eletricidade produzida por combustíveis fósseis. Isso ocorreu entre 2021 e 2022, quando o país registrou a pior estiagem em 91 anos nas regiões sudeste e centro-oeste.
“Espera-se que o recém-eleito presidente Lula aumente as ambições das políticas climáticas do país. Proteger a Amazônia e eliminar gradualmente a produção de combustíveis fósseis são medidas fundamentais”, recordam os cientistas.
Dinamarca na frente, Chile é destaque
Como nos anos anteriores, os três primeiros lugares no ranking permanecem vazios, ou seja, nenhum país está fazendo o suficiente para cumprir as metas de proteção climática do Acordo de Paris.
A Dinamarca segue ocupando a melhor posição na lista. À frente em quase todas as categorias, é a única nação que tem uma política climática nacional “alta” e uma política climática internacional “muito alta”.
Um dos motivos para isso é o fato de ter se comprometido a repassar dinheiro para perdas e danos sofridos em países em desenvolvimento devido às mudanças climáticas. Mesmo assim, a Dinamarca corre contra o tempo para recuperar-se em termos de eficiência energética, que pode lhe custar o alcance de suas metas climáticas para 2025, aponta o CCPI.
Países como Chile, Marrocos e Índia, classificados entre o sexto e o oitavo lugares, também apresentaram bons resultados no relatório deste ano, ficando próximos das líderes Dinamarca e Suécia. O país sul-americano subiu três posições em relação ao ranking de 2021.
Alemanha cai três posições
Geralmente considerada pioneira no combate às mudanças climáticas e geração de energia limpa, a Alemanha também caiu nesta edição do CCPI. Há dois motivos principais: a expansão das importações de gás natural e o aumento das centrais elétricas a carvão.
No geral, o país caiu três posições, do 13º para o 16º lugar. A boa notícia é o declínio de suas emissões de gases de efeito estufa per capita entre 2017 e 2021.
Para Jan Burck, da ONG Germanwatch, que trabalhou no relatório, políticas climáticas mais fracas, decretadas em anos anteriores, estão agora pagando seu preço: a expansão do setor de energia eólica, em particular, caiu maciçamente sob o governo de Angela Merkel. O fracasso no cumprimento das metas climáticas do país também é evidente nos setores de transporte e construção, assinala o especialista.
UE entre evoluções e críticas
Como um todo, a União Europeia (UE) subiu três posições em comparação com 2021, finalizando em 19º lugar. A principal razão para a melhora é a evolução da política climática do bloco que visa reduzir as emissões de gases de efeito estufa em pelo menos 55% até 2030.
No geral, porém, há uma grande discrepância nos desmpenhos dos países-membros, individualmente: nove tiveram classificação “alta”, enquanto sete tiveram nota “baixa”, com Polônia e Hungria figurando no grupo “muito baixo”.
Destaque para a Espanha, que galgou 11 posições para o 23º lugar, graças a melhorias em todas as categorias. A França, por outro lado, caiu o mesmo número de posições para o 28º lugar, devido ao enfraquecimento de suas políticas climáticas e à lenta expansão de seu setor de energia renovável.
“No longo prazo, a UE só subirá mais se apoiar todos os Estados-membros a baixarem rapidamente suas emissões, por exemplo, introduzindo um preço de CO2 para transporte e aquecimento, junto com um significativo fundo social para o clima”, afirma Thea Uhlich, assessora política da Germanwatch.
Como ocorre na China, acrescenta a especialista, a UE e a Alemanha não devem apoiar novas infraestruturas de combustíveis fósseis – nem no próprio país, nem em outras nações, como no Senegal, onde a Alemanha busca cooperação em novos projetos. “O foco deve estar nas energias renováveis. Caso contrário, só enfrentaremos crises ainda maiores no futuro”, advertiu Uhlich.