Ocupação de terra indígena gera embate entre deputado e número dois do ministério de Lula: ‘irresponsável’

InvestigaMS

Uma crítica do deputado Zeca do PT à ocupação (os povos originários classificam como reivindicação legítima) em propriedade de Rio Brilhante causou polêmica com indígenas e até o número dois do Ministério dos Povos Indígenas, Eloy Terena, entrou na discussão. Tudo começou quando Zeca lamentou a ocupação da propriedade na Assembleia Legislativa.

“É uma barbaridade o que estão fazendo com o companheiro, amigo, Raul, em sua propriedade em Rio Brilhante. De um lado, porque não se tem nenhum  estudo antropológico definido para dizer que é terra indígena e do outro, dois ônibus, com aproximadamente 80 indígenas, derramados lá e agora trancaram portão, ocuparam terras, de 400 hectares, proibindo  Raul e sua família de tirar de lá aproximadamente  sete mil sacas de soja que foi colhido e de plantar milho”, declarou o deputado.

Zeca afirma que na ida a Brasília falou com autoridades do governo sobre a preocupação com o que está acontecendo em Mato Grosso do Sul. José Raul, que teve a terra ocupada, é presidente do PT em Rio Brilhante.

“Não conte comigo essa gente, que sem nenhuma razão, ocupa e invade propriedade produtiva, gerando insegurança jurídica e correndo risco de consequências que a gente não tem dimensão do que pode acontecer” complementou, afirmando que o presidente Luís Inácio Lula da Silva não concorda com a ação.

Indígenas lamentaram fala

A fala do deputado gerou indignação em grupos indígenas e até Eloy Terena, número dois do ministério de Lula, criticou a declaração. “Lamentável o pronunciamento do deputado Zeca do PT na AL/MS ao questionar a reivindicação legítima dos Guarani Kaiowá ao seu território tradicional. Laranjeira Nhanderu é terra indígena possui estudo antropológico e é espaço essencial para sobrevivência física e cultural dos GK”, postou, na rede social.

O deputado também foi criticado em documento divulgado em Assembleia do povo Guarani e Kaiowá – Aty Guassu. “Pedimos ao deputado Estadual Zeca do PT que busque voltar às origens sociais que forjam o partido a quem sua figura pública pertence e, sobretudo, respeite os direitos constitucionais indígenas, direitos humanos e direitos internacionais dos Povos Indígenas que o Brasil é signatário”, diz trecho da carta, que pede tradução da fala do deputado em outras línguas para que todos saibam do posicionamento.

O Conselho do Povo Terena também lamentou a fala, afirmando que o deputado sabe da gravidade do problema. “Em seus mais de 30 anos de carreira política, o deputado sabe que posicionamentos como esse são responsáveis, indiretamente, pelo genocídio e situação precária que vivem os 70 mil indígenas de Mato Grosso do Sul”, postou via rede social.

Zeca chama número dois do ministério de irresponsável

Procurado pela reportagem, Zeca criticou Eloy Terena, a quem classificou como irresponsável. “Esse tal de Eloy, que assinou essa nota, é um irresponsável, que se promoveu fazendo essa política radical. Eu tinha avisado alguns companheiros do Lula que ele iria atrapalhar. A tese que o presidente Lula e eu defendo é que temos que buscar o diálogo. Lula já falou que vai fazer reforma agrária, assentamentos, colocar os índios nas suas terras demarcadas, mediante compra e indenização”, declarou Zeca do PT, ressaltando que a terra invadida é produtiva.

O deputado alegou que não é contra a demarcação de terras indígenas, desde que superados todos os problemas, inclusive de ordem judicial, com um laudo “ antropológico sério” e que indenize quem tem a posse de boa fé.

“A grande maioria dos proprietários rurais que têm terras supostamente indígenas adquiriram essas fazendas do Estado ou Governo Federal ou Estadual há 40, 50, 60 anos atrás. Portanto, o mínimo que se espera, se reconhecido como terras indígenas, é que sejam indenizados, inclusive com as benfeitorias que efetivamente realizou ali, ou senão a gente estará sendo injusto com outro segmento e não me permito fazer essa política. Sou favorável a reforma agrária, demarcação de terras indígenas, desde que superada toda tramitação. Ninguém mais do que eu ao longo do tempo da minha vida política se colocou claramente em defesa da reforma agrária e demarcação de terras indígenas, mas sem atropelar o estado de direito, sem criar insegurança jurídica e sem jogar um setor contra o outro, que traz consequência que depois vamos chorar ”, concluiu.

Mãe e filha Guarani Kaiowá na retomada do Tekoha Laranjeira Nhanderu, realizada nesta sexta-feira (03/03/2023) e despejada ilegalmente pela Polícia Militar. Foto: povo Guarani e Kaiowá

Enviada para Combate Racismo Ambiental por Zelik Trajber

Comments (1)

  1. “Trazendo consequência que depois vamos chorar”

    Meu caro Zeca, nós já estamos chorando faz (quase) 523 anos. Para “depois” não temos mais lágrimas. Portanto, é para hoje que queremos de volta pedacinhos daquilo roubado de nós para, ao menos, podermos garantir a sobrevivência dos poucos que ainda restam. Até porque têm mais importância as nossas vidas que algumas sacas de soja de seu chapa. Uma evidência que só não parece óbvia para os que seguem a ideologia racista de extermínio como aquele agora vivendo bem nos Estados Unidos.

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