Trabalho escravo, gado ilegal e pressão política: o que acontecia na terra indígena mais desmatada sob Bolsonaro?

Expulsão de invasores do território Apyterewa completa um mês; é o fim do prazo para saída voluntária de não indígenas

Murilo Pajolla, Brasil de Fato

A megaoperação de desintrusão – como é chamada a expulsão de invasores não indígenas – da terra indígena Apyterewa, no Pará, completou um mês nesta quinta-feira (2). Conforme as autoridades avançavam sobre a área dominada pela pecuária, confirmavam-se ilegalidades e abusos explícitos, que fizeram dos Parakanã reféns dentro da própria terra.

No Brasil, as terras indígenas são bens públicos da União, destinada ao usufruto exclusivo dos indígenas. Mas o estímulo ao crime ambiental que marcou o governo Jair Bolsonaro (PL) permitiu a entrada massiva de invasores, que contavam com apoio de políticos.

Segundo o Ministério Público Federal (MPF), um desses políticos era o prefeito de São Félix do Xingu (PA) João Cléber de Souza Torres. O MPF pediu o afastamento dele do cargo, por não descumprir formalidades legais relacionadas aos direitos dos indígenas e por disseminar notícias falsas com o objetivo de paralisar a retirada dos invasores.

A fase de saída voluntária dos invasores terminou na terça-feira (31). A partir de agora, agentes federais poderão usar a força para cumprir a desintrusão determinada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Gado ilegal destinado a grandes frigoríficos

Entre os denunciados pelo MPF está Cleidi Capanema, ex-vice-prefeita do mesmo município, que se sobrepõe à terra indígena. Registros documentais mostraram que ela movimentou quase 2 mil cabeças de gado com origem na terra Apyterewa.

Segundo a Repórter Brasil, de fazendas localizadas na TI Apyterewa saíram milhares de cabeças de gado para a Marfrig, a segunda maior empresa produtora de carne no mundo. Outros invasores também forneceram gado indiretamente para a JBS.

A força tarefa composta por diversos órgãos federais fez ainda cinco autuações por trabalho análogo à escravidão em fazendas no interior da terra indígena.

Força Nacional matou invasor

Incitados por prefeituras locais e políticos paraenses, invasores tentaram resistir à desintrusão. Segundo o Ministério dos Povos Indígenas, ocupantes ilegais queimaram pontes e reagir com violência à operação federal.

Em 16 de outubro, um ocupante ilegal morreu com tiro de fuzil disparado pela Força Nacional. “Um dos invasores tentou tomar a arma de um dos policiais da Força Nacional de Segurança, resultando em um tiro que, infelizmente, levou a óbito o invasor”, justificou a Secretaria Geral da Presidência, que comanda a desintrusão.

Toda a atividade ilegal na terra indígena, que além da pecuária envolvia o garimpo e extração de madeira, ocorria apoiada em uma grande infraestrutura clandestina, com casas, escolas, pontos comerciais postos de combustíveis, pontes e estradas.

Desmatamento quase zerou, diz governo

Segundo o governo federal, a operação provocou queda de 95,1% do ritmo de desmatamento da região. O Ibama aplicou multas em R$ 4,1 milhões de reais. O Incra fez 857 visitas a pessoas que estavam ilegalmente na área. Quase 120 não indígenas pessoas concordaram se cadastrar para programas sociais.

No balanço da operação, o Ministério dos Povos Indígenas apontou ainda apreensões de drogas, armas de fogo, munições, agrotóxicos e combustível armazenado de forma irregular, além de madeira ilegal, motosserras e maquinários para extração de madeira.

Edição: Thalita Pires

Imagem: Terra indígena mais desmatada do país, Apyterewa sofre com pressão de fazendeiros e grileiros (Acervo Censipam)

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