Saiba quais são as principais propostas contra os direitos indígenas no Congresso

Lideranças apresentaram carta com reivindicações e contra o “pacote da desconstitucionalização” dos direitos indígenas no Legislativo

Carolina Fasolo – Jornalista do ISA

A bancada ruralista segue pressionando pela aprovação no Congresso de propostas contra os direitos indígenas, em especial para inviabilizar as demarcações. Em reação, na semana passada, a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) promoveu mobilizações, em Brasília e outras regiões do país, denunciou alguns desses projetos e listou reivindicações (veja no quadro ao final da reportagem).

Na quarta (30/10), cerca de 400 indígenas marcharam na Esplanada dos Ministérios, em protesto sobretudo contra a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 48, que busca inserir a tese do marco temporal na Carta Magna. O projeto integra o que a Apib chamou de “pacote da desconstitucionalização” dos direitos dos povos originários.

Indígenas também bloquearam rodovias em cinco estados — São Paulo, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Maranhão e Roraima. As manifestações acontecem em um momento em que parlamentares da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado buscam incluir a PEC 48 na pauta de votação. Em julho, os senadores decidiram por um pedido coletivo de vista da proposta, com o compromisso de analisá-la a partir de 30 de outubro.

O adiamento da discussão foi sugerido pelo senador Jaques Wagner (PT-BA), líder do governo, e teve apoio unânime dos demais membros da comissão. Nas últimas semanas, o presidente do colegiado, senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), indicou que deve pautar a PEC 48 a qualquer momento.

Apelidada pelos povos indígenas como “PEC da Morte”, a proposta busca modificar o Artigo 231 da Constituição, estabelecendo um marco temporal para que os povos indígenas possam reivindicar a posse de terras, fixando-o em 5 de outubro de 1988. O projeto foi apresentado pelo senador Hiran Gonçalves (PP-RR) em 21 de setembro de 2023, data em que o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou a mesma tese do marco temporal inconstitucional.

A tese ignora o histórico de remoções forçadas e a violência que essas comunidades sofreram, frequentemente resultando na expulsão das terras que ocupavam tradicionalmente.

Agendas em Brasília

Na mobilização em Brasília, os indígenas participaram de agendas no Congresso e no STF contra o “pacote da desconstitucionalização”. Uma carta de reivindicações foi entregue a representantes do Executivo, Legislativo e Judiciário, com 25 demandas. Entre elas, estão: a publicação de portaria declaratória de 12 Terras Indígenas (TIs); retirada de tramitação e arquivamento definitivo das PECs que atacam os direitos indígenas; a declaração imediata pelo STF da inconstitucionalidade da Lei nº 14.701/2023, que oficializa o marco temporal.

Alessandra Korap Munduruku, que participou dos encontros com representantes dos Três Poderes, destacou os impactos ambientais e climáticos que as comunidades indígenas já estão sofrendo, ressaltando a importância da proteção desses territórios. “O mundo todo está preocupado, mas no Senado ninguém está preocupado com a nossa terra. Estão preocupados em colocar a PEC 48 na Constituição para entrar nas nossas terras com as mineradoras e vender a nossa terra. Quem tem que sair são os invasores, os fazendeiros, sojeiros, as hidrelétricas e as ferrovias”.

Integrante da coordenação-executiva da Apib, Kretã Kaingang, criticou a câmara de conciliação’, que discute a Lei 14.701/2023 no STF sem representação da organização indígena. “As nossas organizações e nós, lideranças indígenas, temos o direito de nos representar e ser representados. O Estado não pode retroceder a constituinte e nos tutelar novamente”, afirmou.

“Pacote da Desconstitucionalização”

Senado 

PEC 48/2023
Altera o art. 231 da Constituição para inserir o marco temporal.

PEC 36/2024
Altera o art. 231 da Constituição para permitir a exploração das TIs com qualquer atividade econômica, de forma direta e até por arrendamento.

PEC 59/2023
Altera o art. 231 da Constituição. Transfere a competência sobre demarcações da União para o Congresso.

PL 6050/2023 (originada na CPI das ONGs)
Libera exploração de atividades de mineração, garimpo, energia elétrica, entre outras, em TIs.

PL 6053/2023 (originada na CPI das ONGs)
Altera a lei nº 6001/73 (Estatuto do Índio). Prevê casos de impedimento e suspeição de peritos antropológicos em processos de demarcação. Dispõe que a comunidade só deverá ser reconhecida como indígena se forem identificados modos de vida distintos da comunidade não indígena envolvente, abrindo margem para aplicação de teorias integracionistas e assimilacionistas sobre identidades indígenas.

PEC 10/2024
Modifica o art. 231 da Constituição para permitir a prática de quaisquer
atividades florestais e agropecuárias (inclusive a monocultura), bem como celebrar contratos de arrendamento e parceria, para comercializar a produção.

PEC 132/2015
Altera o art. 231 da Constituição. Prevê a indenização de invasores de TIs demarcadas até 05 de outubro de 2013. Já foi aprovada no Senado e, em novembro de 2023, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), autorizou a criação de comissão especial para analisar o projeto.

Câmara dos Deputados

PL 4039/2024
Muda o processo de demarcações. Altera a lei 14.701/23 para indenizar, por danos materiais e imateriais, invasores de TIs em casos de retomadas em áreas onde o processo demarcatório ainda não foi finalizado. Prevê a suspensão do processo de demarcação enquanto houver “ocupação irregular” na área.

PL 709/2023 (“Pacote Anti-Invasão”)
Altera a lei 8629/1993. Criminaliza participantes de ocupações e de retomadas de terras.
Quem for acusado de “invasão de domicílio” ou “esbulho possessório” fica impedido de acessar benefícios e políticas sociais, como reforma agrária, “Minha Casa Minha Vida”, assistência social, inscrever-se em concursos públicos, entre outros. Já foi aprovado na Câmara e enviado ao Senado.

PL 8262/2017 (“Pacote Anti-Invasão”)
Autoriza o despejo imediato de ocupantes de terra pela Polícia Militar ou Polícia Federal, sem que haja necessidade de decisão judicial. Prevê o cumprimento de reintegrações de posse em até 48 horas. Cria o tipo penal “Esbulho Possessório Coletivo”, com penalização mais severa que o esbulho possessório. Aguarda a apreciação na Câmara de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC).

PL 4183/2023 (“Pacote Anti-Invasão”)
Impõe a criação de CNPJ aos movimentos sociais e populares para fins de criminalização civil e penal. A obrigatoriedade de aquisição de personalidade jurídica se aplicará a movimentos sociais organizados em mais de três estados e com destaque na imprensa local e nacional. Aguarda a apreciação na CCJC.

Foto: Hellen Loures/Cimi

Deixe um comentário

O comentário deve ter seu nome e sobrenome. O e-mail é necessário, mas não será publicado.

12 − 11 =