Tania Pacheco
O Comitê Organizador dos Jogos Paralímpicos comete um ato de racismo e desrespeito a um povo indígena do Brasil, disseminando falácias e preconceito em nota sobre o percurso da tocha olímpica. A Fundação Nacional do Índio, cumprindo com seu papel institucional, divulga uma Nota de Repúdio a respeito do fato. O Ministro da Justiça manda seu Secretário-Executivo “dispensar” o diretor que a assinou e que vinha ocupando a presidência interina desde a saída do governo legitimamente eleito. Assinada no dia 19, a portaria é publicada no Diário Oficial de hoje, 20, ‘designando’ Agostinho do Nascimento Netto para o cargo de “substituto do Presidente da Fundação Nacional do Índio … em seus afastamentos e impedimentos eventuais”…
Se há algo a ser criticado à Funai quanto à Nota de Repúdio, trata-se exclusivamente do tempo que sua direção levou para reagir à ‘ação’ do Comitê Paralímpico. Enquanto organizações e a mídia alternativa protestavam, incluindo este blog, somente na tarde de sexta-feira, 16, a Nota foi lançada (leia AQUI). O atraso não prejudicou, entretanto, o justo tom de indignação contra o preconceito/racismo evidente e em defesa dos direitos indígenas. A questão, entretanto, é que a notícia do Comitê tinha origem e objetivos claros, ou não chegaria à desfaçatez de citar um projeto de lei defendido pela chamada bancada da bíblia, o qual por sua vez se baseia em denúncias que já demandaram até mesmo ação do Ministério Público Federal (aquele que se preocupa com povos indígenas, quilombolas, comunidades tradicionais e com a Constituição). Então, o cumprimento das tarefas e obrigações neste caso teria deixado de ser elogiável e passado a constituir motivo de punição, de acordo com informações ‘vazadas’ do prédio do Ministério da Justiça. Será mesmo?
As lambanças não dizem respeito apenas às prerrogativas constitucionais; há, igualmente, lambanças formais. A Funai vinha tendo sua presidência ocupada interinamente por um de seus diretores, de acordo com a lei. Agora, foi nomeado um “substituto” para responder pelo cargo durante os “afastamentos e impedimentos eventuais” do Presidente. Qual? O último indicado pelo governo legitimamente eleito? Impossível. O interino que ousou cumprir o seu papel e, presume-se, deve voltar à diretoria que ocupava antes?
Ora, para “substituto” os atuais ocupantes do prédio da Justiça “designaram” um Procurador da Fazenda Nacional, oriundo da coordenação da 2ª Região e ultimamente ocupando cargo de assessoria no Ministério. Acontece que, para poder ser indicado como “substituto do Presidente”, o senhor Agostinho do Nascimento Netto deveria forçosamente ‘estar’ servidor da Funai, lá lotado, e inclusive ocupante de algum cargo, por menor que fosse o DAS em questão…
Ultimamente, consta que o “substituto” teria andado por Mato Grosso do Sul, faz tempo barril de pólvora maior dos conflitos com indígenas no País e recordista de violências, assassinatos e suicídios. Nessas andanças, semana passada teria mantido reuniões com os ruralistas da Famasul, discutindo como pagar pela terra nua das ‘propriedades’ que ocupam terras indígenas. Será esse um novo tipo de DAS?
Ou será que a saída de Artur Nobre Mendes estará mais ligada, como se pode presumir, à denúncia pela ONU das violências contra os povos indígenas – “ONU denuncia aumento de 50% em assassinatos de indígenas” – anunciada para hoje, em Genebra, sem a presença exatamente de representantes da Fundação e do Ministério da Justiça?
O ‘castigo’ pela Nota de Repúdio, talvez pensem os ocupantes do prédio do Ministério, seria então uma medida preventiva contra qualquer tentativa, por parte da Funai, de oferecer uma resposta digna ao Relatório que a esta hora deve estar sendo apresentado ao Conselho de Direitos Humanos da ONU…
Incompetência é pouco, para definir as lambanças do atual (des)governo, da vergonha internacional ao ridículo em território nacional! Só pode ser ultrapassada, mesmo, pela falta de pudor e pela capacidade de superarem-se a cada dia.
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Criança Munduruku. Foto de Rachel Gepp (Nov/2014).
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