Por Fernanda Couzemenco, Século Diário
A substituição da Mata Atlântica por plantações de eucaliptos no norte e noroeste do Espírito Santo foi outro antigo e grave crime socioambiental denunciado veementemente por Augusto Ruschi e que mancha de sangue e cinzas a história do Espírito Santo.
Extermínio regional de um dos biomas mais biodiversificados do mundo, desertificação do solo, desaparecimento de centenas de córregos e rios, morte, expulsão, marginalização e, agora, criminalização e perseguição – inclusive com apoio policial – de comunidades tradicionais… Será possível pagar um passivo socioambiental desse tamanho?
Incrível como “a mais avançada tecnológica ambiental” está sempre muito aquém das necessidades de proteção da vida. Na década de 1960, era moderno derrubar floresta nativa com correntões para plantar uma espécie exótica em grandes extensões de terra.
Era o “progresso”, ao qual se submeteram – e ainda se submetem, a maioria, servilmente – os governantes, concedendo incentivos, isenções e tantas outras facilidades para que a instalação da parte mais suja e criminosa da indústria mundial fosse concretizada nas terras de indígenas e quilombolas.
Ruschi pesquisou, escreveu, falou, bradou, lutou muito contra a instalação das monoculturas de eucalipto no Espírito Santo. Mas essa foi uma batalha perdida. Não só a Justiça, mas também os governos, empresários e acadêmicos gananciosos e corruptos são cegos e lançam suas vendas contra os olhos da população. Ainda se sustenta o discurso de que é polêmica a agressividade da silvicultura exótica em larga escala. “Não há provas…”
O velho “dividir para conquistar”
Assim como “não há provas” também de que houve grilagem e expulsão de indígenas e quilombolas para que a Aracruz Celulose (Fibria) e depois a Suzano instalassem seu manto verde mortal sobre a região.
Joice Nascimento Cassiano, liderança na comunidade do Linharinho, em Conceição da Barra, conta, com tristeza, uma das mais novas estratégias de guerra da Aracruz Celulose (Fibria) para minar a luta quilombola pela retomada de seu território tradicional.
Ao lado da criminalização e perseguição das lideranças, a empresa tem difundido o Programa de Desenvolvimento Rural Territorial (PDRT), em que as famílias que fazem a adesão, assinam um contrato em que aceitam os termos da empresa, onde ela diz “ceder suas terras” para uso das famílias, e somente em atividades e espaços por ela determinados.
Trata-se de uma forma de abrir mão da luta pela titularidade da terra, ao aceitar a cessão da mesma por parte da empresa. “É o velho ‘dividir pra conquistar’”, lamenta Joice. “Esses contratos dão direito e poder pra empresa dizer que a terra é dela”, adverte.
Justiça convoca testemunhas
A CPI da Aracruz Celulose, instalada na Assembleia Legislativa em 2002, foi encerrada sem relatório final por força de uma ação da empresa acatada pela Justiça. Mas os dados levantados pelos deputados serviram de base para o Ministério Público Federal ingressar com uma Ação Civil Pública contra a Aracruz, o Estado e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Segundo matéria publicada na última terça-feira (03) no site da Assembleia, a ACP (0000693-61.2013.4.02.5003) “pede a anulação dos títulos de domínio de terras devolutas cedidas à empresa pelo processo ter sido realizado de maneira fraudulenta, a devolução das terras obtidas e, caso o Estado verifique a condição de quilombolas, a titulação em favor das comunidades que ocupavam essas áreas, além do pagamento de indenização”. E que, no último despacho do caso, constante no site da Justiça federal, o juiz responsável deferiu, no dia 13 de dezembro, pela produção de prova testemunhal, cabendo às partes envolvidas indicarem suas testemunhas sobre os fatos em questão.