Foi golpe, sim! Violação da Constituição pelo governo golpista provoca reação em massa em defesa da liberdade de ensino
Por Raquel Wandelli , no Jornalistas Livres
“É ditatorial, mas às favas, senhor presidente, neste momento, todos os escrúpulos de consciência.” (Jarbas Passarinho, ministro da Educação do ditador golpista Emílio Garrastazu Médici – golpe de 1964, na instauração do AI-5, em 1968)
“O MEC irá encaminhar solicitação para a apuração de improbidade administrativa por parte dos responsáveis pela criação da disciplina na Universidade de Brasília (UnB) por fazer proselitismo político e ideológico de uma corrente política usando uma instituição pública de ensino”. (ministro Mendonça Filho – ditadura de Temer – golpe de 2016)
Jarbas Passarinho, o ministro da Educação do golpe de 64, teve mais tempo à frente da pasta do que Mendonça Filho, seu sucessor no golpe de 2016, para violar a liberdade de ensino e a vida dos que lutavam contra a ditadura militar. Ambos já guardam, todavia, diversas semelhanças no pensamento ideológico. Passarinho também ficou celebrizado por perseguir estudantes e professores universitários, sobretudo da Universidade de Brasília, que liderava uma greve corajosa contra a ditadura, em 71. O então ministro recebia as lideranças em seu gabinete para dar um puxão de orelha severo de pai, despedia-se aconselhando-os a se afastar de movimentos subversivos e baderneiros e dias depois eram todos identificados, presos e encaminhados às masmorras da tortura.
Talvez o ministro Jarbas Passarinho supere seu sucessor num único quesito: o da autenticidade, ou cara de pau. Enquanto nenhum integrante do Regime Militar admitia chamar a dita “Revolução de 64” de golpe, ele preferiu escancarar que “é golpe mesmo!”. Nomeado a diretor de Direitos Humanos por FHC, em 1996, perseguiu os Movimentos dos Trabalhadores Sem-Terra até o fim e se posicionou contra o direito de indenização das pessoas perseguidas pela Ditadura. Morreu com quase cem anos, no emblemático ano do de 2016, depois de uma vida de luxo e impunidade, perseguindo os movimentos sociais e trabalhistas. É dele a célebre frase, proferida ao defender a instauração do AI 5 na Tribuna do Senado, em 1968, o ato que aboliu de vez todos os direitos constitucionais: “É ditatorial, mas às favas, senhor presidente, neste momento, com todos os escrúpulos de consciência”. Mendonça, por sua vez, exasperou-se ao lhe entregarem uma ementa que dá ao que ele chama de “movimento pró-impeachment”, o nome justo e verdadeiro: é golpe. Numa demonstração clara de sectarismo e de ignorância política, desconhece que proselitismo político um curso dedicado a discutir o país após o golpe de 2016 e seus efeitos para a democracia.
Mas a violência de sua investida despropositada contra a cátedra Tópicos Especiais de Leitura 4 do Curso de Ciências Políticas da UnB, deixa claro sua afinidade com os métodos de intimidação, constrangimento e criminalização de professores e alunos adotados pelo MBL e pelos leões de chácara da Ditadura. Num tom ameaçador, Mendonça Filho afirmou em nota que pretende processar os responsáveis pela oferta da disciplina por “improbidade administrativa”. Anunciou que vai acionar a Advocacia-Geral da União, o Tribunal de Contas da União, a Controladoria-Geral da União e o Ministério Público Federal para apurar os responsáveis, bem nos moldes dos antecessores da pasta na Ditadura de 64. A ofensiva contra um curso em nível de pós-graduação e – o que é mais importante – de caráter facultativo, fez cair de vez a aura de “tolerância e ausência de preconceito” que ele tentou forjar no encontro com a dupla Marcello Reis e Alexandre Frota. Ficou bem marcada a diferença no tratamento dedicado a um dos cientistas políticos mais atuantes, produtivos e prestigiados do país, em relação aos dois Revoltados On-Line que depois se fundiram ao MBL e vieram a se processar mutuamente por estelionato, lavagem de divisas e formação de quadrilha.
A truculência do ministro não deixou nada a desejar aos seus antecessores do Golpe de 64. “A iniciativa traz indicativos claros de uso de toda uma estrutura acadêmica, custeada por todos os brasileiros com recursos públicos, para benefício político e ideológico de determinado segmento partidário”, disparou ainda o ministro, que parece ter se inspirado no MBL para criar essa espécie de “Universidade sem Partido”. Diante da ameaça de processar o professor por “improbidade administrativa”, recorrendo a todo o aparato de repressão e sustentação do golpe (Advocacia Geral da União, Ministério Público Federal, Controladoria Geral da União, Tribunal de Contas da União), as manifestações de interesse e procura pela disciplina anunciada no Facebook do professor se multiplicaram.
A ofensiva golpista contra o professor e a universidade gerou uma reação proporcional aos excessos de Mendonça. Em ato contínuo explodiram manifestações nas redes sociais, seguidas de notas de repúdio, cartas de solidariedade em apoio a Felipe Miguel e à UnB emitidas por comunidades científicas, universidades de todo o país, organizações estudantis, partidos políticos, entidades democráticas, etc. A atual gestão da universidade informou que respeita a autonomia pedagógica de cada Centro e ainda argumentou que as acusações são incabíveis, uma vez que a disciplina tem oferta como matéria optativa. Uma representação no Conselho de Ética da Presidência da República e na Procuradoria-Geral da República foi protocolada no dia 22/2 contra o ministro da Educação, Mendonça Filho por violação da autonomia universitária e à liberdade de cátedra. Assinam a representação o ex-reitor da UnB, José Geraldo de Sousa Júnior, o ex-procurador de Estado de São Paulo, Marcio Sotelo Felippe, os deputados federais Paulo Pimenta (PT) e Wadih Damous (PT), e Patrick Mariano Gomes, advogado.
QUEM É FELIPE MIGUEL – VIDA E OBRA
Nascido no Rio de Janeiro, Luís Felipe Miguel passou a adolescência e boa parte da juventude em Florianópolis, onde fez Escola Técnica Federal e se formou em Jornalismo pela UFSC, ao lado da esposa Regina Dalcastagné. É um dos cinco filhos de Salim Miguel e Eglê Malheiros, velhos comunistas do PCB, que deram uma contribuição inestimável à cultura catarinense, com a introdução do modernismo no Estado pelo cinema, pela literatura e pelas artes. O pai, imigrante libanês, falecido há dois anos, é um dos escritores mais premiados e conhecidos do Brasil, fundador da Editora da UFSC, que dirigiu por várias décadas. A mãe, professora aposentada do Instituto Estadual de Educação, também assina uma vasta contribuição para a pedagogia, a literatura e a dramaturgia, com livros de ensaios, traduções, contos, roteiro para teatro e cinema.
Intelectual com larga capacidade de relacionar o conhecimento teórico à cena política do cotidiano, o jornalista e cientista político Luís Felipe Miguel assina as obras Democracia e representação; territórios em disputa, Consenso e conflito na democracia contemporânea e Política e mídia no Brasil; episódios na história recente, além de dezenas de artigos e ensaios em revistas científicas e coletâneas de livros. Ao contrário do que diz o ministro, que na nota o acusa de reduzir o ensino ao partidarismo, petismo e lulismo, o professor já manifestou publicamente em seus escritos e conferências sua postura crítica aos governos Lula e Dilma, o que não o impede de reconhecer os avanços e de posicionar-se desde o início do golpe em defesa do mandato legítimo da presidenta eleita Dilma Roussef.
Seus escritos versam sobre a destruição da democracia pela instauração de um estado policialesco e punitivista que rasgou a Constituição e o Estado Democrático e de Direito. Mesmo nunca tendo sido filiado ao PT, ao contrário do que afirma ainda o ministro, seus textos analisam a perseguição seletiva do ex-presidente Lula, vítima de um dos casos mais exemplares de Lawfare na história mundial, assim como o reitor da UFSC, Luís Carlos Cancellier, amigo de juventude, que foi induzido ao suicídio por um processo de abuso de poder que ele ajudou a denunciar.
Para quem de fato lê, seus artigos não deixam transparecer nenhuma filiação partidária, mas um teórico de esquerda engajado nas questões dramáticas do seu tempo e do seu país, cuja escritura evidencia um pensamento de complexidade científica muito distante das acusações grosseiras do ministro.
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LEIA A NOTA DO MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO NA ÍNTEGRA
O ministro da Educação, Mendonça Filho, lamenta que uma instituição respeitada e importante como a Universidade de Brasília adote uma prática de apropriação do bem público para promoção de pensamentos político-partidário ao criar a disciplina “O golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil”, que será ministrado no curso de Ciências Políticas da universidade.
O MEC irá encaminhar solicitação para a Advocacia-Geral da União (AGU), ao Tribunal de Contas da União (TCU), à Controladoria-Geral da União (CGU) e ao Ministério Público Federal (MPF) para a apuração de improbidade administrativa por parte dos responsáveis pela criação da disciplina na Universidade de Brasília (UnB) por fazer proselitismo político e ideológico de uma corrente política usando uma instituição pública de ensino.
A ementa da disciplina traz indicativos claros de uso de toda uma estrutura acadêmica, custeada por todos os brasileiros com recursos públicos, para benefício político e ideológico de determinado segmento partidário, citando, inclusive, nominalmente o PT. Dividida em 5 módulos, a disciplina tem indicativos de ter sido criada exclusivamente para militância partidária, algo que pode ser percebido no caso da temática de algumas unidades como “o lulismo e a promoção da paz social”, “o governo Dilma e a tentativa de repactuação lulista” e “a resistência popular e as eleições de 2018”.
Além disso, há, também, módulos tratando sobre “O PT e o Pacto Lulista”, “Democratização e Desdemocratização” e “O Governo ilegítimo e a resistência”, em um ataque claro às instituições brasileiras, incluindo o próprio Supremo Tribunal Federal (STF).
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Em homenagem e solidariedade ao professor, os Jornalistas Livres reuniram aqui num único documento o acervo in progress dessas manifestações. A maioria das notas relaciona o caso aos recentes ataques às universidades patrocinados pelos agentes de exceção do governo intervencionista de Temer, como as invasões às universidades federais do Paraná, Santa Catarina e Minas Gerais como uma tentativa de desmoralizar as instituições de ensino superior e minar a autonomia universitária para promover o ensino pago.
Emblemático que um dia após o ataque de Mendonça, a Universidade Federal de Juiz de Fora também sofreu uma intervenção da Polícia Federal, com condução coercitiva e prisão preventiva do reitor, dentro do mesmo modus operandi que vem aterrorizando a comunidade universitária do país. Segue também o link para as matérias com o conteúdo da disciplina indicado pela ementa estão em PDF neste link, organizado pelo leitor e compartilhado nas redes sociais: AQUI.
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NOTA PUBLICADA PELO PROFESSOR LUÍS FELIPE MIGUEL (22/2)
Agradeço as centenas de mensagens de solidariedade que recebi nas últimas horas. Diante da ameaça de censura à disciplina que estou oferecendo e das tentativas de intimidação, é essencial saber que conto com o apoio de tantas pessoas, que não necessariamente concordam com minhas escolhas políticas ou acadêmicas, mas que coincidem no entendimento de que a universidade é lugar de liberdade e de debate.
Agradeço, em especial, à Universidade de Brasília, que não hesitou em reafirmar seu compromisso “com a liberdade de expressão e opinião – valores fundamentais para as universidades, que são espaços, por excelência, para o debate de ideias”.
(E aproveito para agradecer também todos os que sugeriram temas e textos para aprimorar o curso. Será difícil acomodar mais do que uma pequena parte das sugestões no programa, cuja elaboração já foi um exercício de cortar e cortar conteúdo, mas certamente as dicas contribuirão para alimentar as discussões nas aulas.)
Muitos têm também sugerido formas de ampliar o alcance da disciplina, como transmissão online ou aulas em espaços abertos. Entendo o objetivo, mas penso que, no momento, o principal é reafirmar que se trata de uma disciplina normal, a ser ministrada normalmente na universidade. Ela não é um acontecimento político – exceto, claro, no sentido de que o processo de ensino e aprendizagem é sempre um ato político.
O que não impede que eu contribua para a difusão do debate, dentro e fora da UnB, para além das aulas que ministrarei ao longo do semestre. Caso seja possível, divulgarei depois parte do conteúdo do curso, para circulação mais ampla. Sandra Helena sugeriu uma versão “pocket”, para ser ministrada como minicurso em outras universidades, o que seria bacana se fosse viabilizado. Letícia Sallorenzo tomou a iniciativa de reunir os textos do curso numa pasta virtual (obrigado!) e, assim que estiver completo, divulgo o link.
A divulgação do programa foi feita, como sempre faço a cada início do semestre, a fim de dar clareza do conteúdo a eventuais interessados. O alvoroço surgiu com a publicação de uma reportagem alarmista, por um pequeno site de notícias aqui de Brasília. Talvez seja só coincidência, mas há poucos dias recusei um convite para escrever – de graça – para este mesmo site.
O conteúdo da disciplina não é diferente daquilo que tem sido discutido por muitos colegas interessados em compreender o Brasil atual. O que causou reboliço foi o uso da palavra “golpe” já no título da matéria. Tenho razões, que creio muito sólidas, para sustentar que a ruptura ocorrida no Brasil em 2016 se classifica como golpe. Tenho discutido e continuarei discutindo essas razões com estudantes e com colegas, nos espaços do debate universitário, e com a sociedade civil, em minhas intervenções públicas. Não vou, no entanto, justificar escolhas acadêmicas diante de Mendonça Filho ou de seus assessores, que não têm qualificação para fazer tal exigência.
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NOTA DO PROFESSOR LUÍS FELIPE MIGUEL NO DIA 21/2
Um site aqui de Brasília publicou a ementa da minha disciplina sobre o golpe e vários jornais correram à UnB para pedir posição sobre este “absurdo” – começando pelo pasquim fascistoide do Paraná, especializado no ataque à universidade pública.
Não vejo nenhum sentido em alimentar a falsa polêmica que querem abrir. Pedi à assessoria de comunicação da universidade que encaminhasse, de minha parte, apenas a seguinte observação:
Trata-se de uma disciplina corriqueira, de interpelação da realidade à luz do conhecimento produzido nas ciências sociais, que não merece o estardalhaço artificialmente criado sobre ela. A única coisa que não é corriqueira é a situação atual do Brasil, sobre a qual a disciplina se debruçará. De resto, na academia é como no jornalismo: o discurso da “imparcialidade” é muitas vezes brandido para inibir qualquer interpelação crítica do mundo e para transmitir uma aceitação conservadora da realidade existente. A disciplina que estou oferecendo se alinha com valores claros, em favor da liberdade, da democracia e da justiça social, sem por isso abrir mão do rigor científico ou aderir a qualquer tipo de dogmatismo. É assim que se faz a melhor ciência e que a universidade pode realizar seu compromisso de contribuir para a construção de uma sociedade melhor.
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Da Associação Brasileira de Ciência Política
Nota de repúdio à violência contra a liberdade de cátedra
A Diretoria da ABCP vem manifestar a sua profunda preocupação com o intenção do ministro da Educação, Mendonça Filho, veiculada por diversos sites de notícias na quarta feira, dia 21 de fevereiro, de acionar os órgãos de controle para analisar a legalidade de uma disciplina a ser lecionada no Instituto de Ciência Politica da Universidade de Brasília (IPOL-UNB), cujo conteúdo refere-se à análise da democracia brasileira contemporânea, abrangendo o período que antecede a deposição da ex-presidente Dilma Roussef até os dias atuais.
Diretoria da ABCP entende que a Constituição Federal de 1988, no seu artigo 206, II, garante aos docentes e discentes o pleno exercício da liberdade de ensinar e aprender, assim como faculta às Universidades brasileiras autonomia pedagógica. Ressalte-se ainda que a disciplina questionada pelo MEC é uma cadeira optativa de ementário livre, sendo facultado aos docentes montar o programa com o intuito de apresentar pesquisas recentes e debater temas da atualidade. A rigor, nenhum aluno ou aluna do curso de graduação em Ciência Política da UNB é obrigado a cursá-la. Por outro lado, proibir a realização da disciplina impediria os discentes que assim o desejassem de cursá-la, o que fere, por suposto, o princípio da liberdade de aprender.
Diante disto, consideramos que, se a intenção manifesta do Ministro de fato se concretizar, a autonomia pedagógica das universidades brasileiras estará ameaçada, assim como os direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição Federal. O ato não poderá ser avaliado de outra forma, se não como censura, característico de regimes de exceção.
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Nota da Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação (Compós)
A Compós manifesta sua solidariedade professor Professor Luis Felipe Miguel e reforça a nota da Compolítica, ressaltando a importância de mantermos a liberdade de cátedra e nossa autonomia no exercício da docência. Esses valores foram violentamente atacados pela ameaça do Ministério da Educação em intervir na disciplina “Tópicos Especiais em Ciência Política 4”, com o tema “O Golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil”.
Também manifestamos nosso repúdio ao sucateamento de uma instituição como o CPDOC acentuado com as recentes demissões das docentes Luciana Heyman, Dulce Pandolfi, Verena Alberti e Mônica Kornis. Por último, manifestamos nossa solidariedade à professora Jaqueline Muniz, do departamento de Segurança da UFF, atacada de forma misógina e preconceituosa nas redes sociais após entrevista na GloboNews questionando a intervenção militar no Rio de Janeiro.
A Compós foi fundada em 16 junho de 1991, em Belo Horizonte, com o apoio da Capes e do CNPq, a partir da iniciativa de alguns pesquisadores e representantes dos seguintes cursos de Pós-Graduação: PUC-SP, UFBA, UFRJ, UnB, UNICAMP, UMESP.
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ABCP Centro-Norte – Pela consolidação da expansão da C.Política no Brasil
NOTA DE REPÚDIO
A Diretoria Centro-Norte da Associação Brasileira de Ciência Política – ABCP Centro-Norte repudia o processo de perseguição ao pensamento crítico contra o professor Luis Felipe Miguel, do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília, que representa as ameaças à liberdade de cátedra de todos/as os/as cientistas políticos/as que atuam em instituições de ensino brasileiras.
Nesta quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018, um site de notícias publicou uma matéria sobre a disciplina optativa de graduação que o professor Luis Felipe Miguel ofertará no primeiro período letivo de 2018 na Universidade de Brasília: “Tópicos especiais em Ciência Política: O golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil”. A matéria repercutiu em outros veículos de mídia, causando uma falsa polêmica sobre a possibilidade de abordar academicamente o processo de instabilidade democrática sob a denominação de golpe, que teria unicamente, segundo o Ministro da Educação, Sr. Mendonça Filho, o objetivo de aparelhar a universidade e partidarizar o ensino público brasileiro.
Esse evento mostra um evidente desconhecimento das profícuas discussões acadêmicas em curso na nossa disciplina há pelo menos dois anos, ignorando uma parte significativa e muito séria da Ciência Política brasileira que desde 2016 analisa a situação pela qual passa o país atualmente como um golpe de Estado, não sem marcados interlocutores discordantes.
Faz parte da vocação da Ciência Política a preocupação com os fenômenos políticos de forma ampla, diversa, inclusiva e livre. A liberdade de cátedra é uma prerrogativa do trabalho docente porque permite a diversidade de ideias, a contraposição de argumentos e a construção de um campo crítico de conhecimento. Construir uma discussão acadêmica desde a aberta perspectiva do/a pesquisador/a, como os próprios debates das ciências sociais sobre epistemologia e metodologia nos indicam, é um ponto de partida imprescindível para a construção do diálogo na área, dado que todo conhecimento (científico ou não) carrega seu viés.
O curso ofertado pelo professor Luis Felipe Miguel, reconhecido pesquisador da Ciência Política brasileira e um dos professores mais produtivos em termos de publicações da nossa regional, está ancorado em muitas discussões centrais da área, como se vê na sua sugestão preliminar do programa de curso: AQUI.
A resposta autoritária do Ministro da Educação, Sr. Mendonça Filho, criticando a proposta de curso do professor Luis Felipe Miguel na imprensa (https://www.poder360.com.br/…/ministerio-da-educacao-prepa…/), desrespeita os fundamentos da liberdade de cátedra e da autonomia universitária no Brasil e ameaça o desenvolvimento científico da nossa área de atuação. Ao afirmar que “[e]stá claro que não houve base científica na criação desse curso. Contraria as boas práticas da educação. Alguém não pode ter uma ideia ou uma opinião e simplesmente oferecer dentro de uma universidade 1 [sic] curso”, o Ministro mostra desconhecimento do estado da arte da Ciência Política brasileira, falta de cuidado com as boas práticas de educação, confusão entre opinião infundada e argumento científico e também ameaça a construção de um debate de ideias crítico e diverso no país. O Ministério da Educação, em vez de fomentar as boas condições de trabalho nas instituições federais de ensino superior, nos últimos anos vem impondo um contexto de cortes orçamentários e limitações que está nos levando ao sufocamento da universidade pública, gratuita e de qualidade no Brasil, assim como da ciência brasileira.
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Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais
ANPOCS encontra-se estarrecida diante da atitude do ministro da educação em acionar os órgãos de controle para analisar a legalidade de uma disciplina a ser lecionada no Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (IPOL-UNB), o que comprova a tese básica do curso, e aguarda uma resposta firme do Ministério Público de defesa da legalidade e da democracia.
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Manifesto minha solidariedade ao professor Luis Felipe Miguel, da UNB, diante da arbitrária e retrógrada censura feita pelo ministro da educação à sua cátedra “O golpe de 2016 e o futuro da democracia”.
Impedir que se chame os fatos e acontecimentos pelo nome é reação típica dos regimes de exceção. No passado, durante a ditadura, era proibido dizer que havia presos políticos no Brasil, embora eles enchessem os presídios país afora.
Durante o impeachment, sem crime de responsabilidade, tentaram de todas as formas bloquear a denúncia do novo tipo de golpe que estava ferindo a democracia brasileira.
Censurar, agora, uma disciplina na UNB que caracteriza como golpe o processo inaugurado pelo impeachment, em 2016, deixa evidente o aprofundamento do arbítrio e da censura.
Os atos do pseudo-ministro são uma terrível agressão à autonomia universitária, à cultura acadêmica, à livre circulação de ideias e à própria democracia. É abuso típico dos estados de exceção. os maiores inimigos da cultura e da educação.
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Do Diretório Central dos Estudantes da UnB
MANIFESTO EM DEFESA DA AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA
O ministro da educação do governo golpista, Mendonça Filho, anunciou que vai operar uma ação judicial contra a Universidade de Brasília pelo anúncio de oferta de uma disciplina intitulada “Tópicos especiais em Ciência Política: o golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil” que procura analisar as fragilidades do sistema político pós ruptura democrática, a ampliação da desigualdade social causada pela política de retirada de direitos e as possibilidades de retomada da democracia colocadas pela resistência popular.
A reitoria da UnB distribuiu nota dizendo que “reitera seu compromisso com a liberdade de expressão e opinião – valores fundamentais para as universidades, que são espaços, por excelência, para o debate de ideias em um Estado democrático” além de afirmar que a formulação de disciplinas é responsabilidade das unidades acadêmicas que possuem autonomia sobre suas ementas e produção científica.
Nós repudiamos esse anúncio do MEC, mais uma medida do estado de exceção em que estamos vivendo, e que ocorre no mesmo momento em que avança a militarização da sociedade, com a intervenção no Rio de Janeiro.
Exigimos que o MEC retire essa ameaça que fortalece o obscurantismo na educação, pisoteia a liberdade das instituições produzirem conhecimento científico.
Defendemos a autonomia didática e administrativa da UNB, pela recomposição orçamentária contra os violentos e injustificáveis cortes orçamentários.
Lutamos por uma universidade com orçamento compatível com suas necessidades estruturantes. Para que reitores possam conduzir os trabalhos sem o receio da arbitrariedade jurídico policial como conduções coercitivas que levaram ao sacrifício do reitor da UFSC e ao atendado à liberdade na UFMG.
Lutamos para que estudantes e professores possam trabalhar pela construção de um conhecimento útil à nação, que contribua para a reflexão dos problemas e desafios de nossa nação e como superá-los, cumprindo assim a função social da universidade.
A consciência democrática da UNB não permitirá a violência anunciada pelo MEC!
DCE UnB Honestino Guimarães – – GESTÃO TODAS AS VOZES
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SOLIDARIEDADE AO PROFESSOR LUIS FELIPE E EM DEFESA DA AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA
Nós, docentes da Universidade de Brasília, manifestamos nossa total e irrestrita solidariedade ao Professor Luís Felipe Miguel, docente do Instituto de Ciência Política de nossa instituição, que está sendo atacado pela mídia e pelo Ministério da Educação pelo simples motivo de exercer com zelo e responsabilidade o seu dever de educador e oferecer a disciplina Tópicos Especiais de Ciência Política: o golpe de 2016 e o futuro da democracia no Brasil.
O ataque não é, na verdade, ao professor Luís Felipe. É um ataque a um dos pilares que sustentam as universidades no mundo e em nosso pais. É um ataque à liberdade de ensinar. Nossa UnB, que foi vilmente atacada durante o período da ditadura militar, esteve na frente do processo de redemocratização e faz parte da conquista prevista nos artigos 205, 206 e principalmente no artigo 207 da Constituição Federal de 1988. A autonomia universitária, em todos os seus aspectos, mas especialmente a didático-cientifica, são conquistas fundamentais para a existência plena de nossas universidades. A liberdade de cátedra é uma das essências de uma universidade e está sendo duramente atacada.
Presenciar um Ministro da Educação, mesmo que seja de um governo ilegítimo e fruto de um golpe, insinuando intervir na UnB por discordar e achar imprópria a oferta de uma disciplina que versa sobre um acontecimento fundamental para a história política recente do país, é um fato gravíssimo e, caso nossa reação não seja proporcional a sua gravidade, abrirá as portas para mais ataques a autonomia universitária.
Este ataque deve ter o repúdio de toda a comunidade. Cabe a nossa seção sindical defender o docente em questão e se manifestar claramente e urgentemente. A Universidade, por meio de seu conselho máximo, deve de maneira contundente, repudiar a tentativa de ingerência do gestor do MEC na sua autonomia.
E mais, a atitude ministerial, os constantes ataques a autonomia didático-pedagógica de docentes da educação básica, somada a intervenção militar no Rio de Janeiro, com revistas em mochilas de alunos do ensino fundamental, e outras medidas autoritárias, denota que nossa democracia está fragilizada e sendo vilipendiada a cada dia. Não são somente nossos direitos trabalhistas e previdenciários que estão sendo ameaçados e retirados, mas há uma tentativa de cercear a liberdade de expressão.
Assim como no passado, nós resistiremos. Faremos jus a história gloriosa de luta democrática que a Universidade de Brasília carrega. Não passarão.
Assinam:
Raquel de Almeida Moraes – Representante dos Coordenadores de Cursos da Faculdade de Educação no CEPE.
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Do Fórum Renova ANDES
Foi golpe sim! Nota de solidariedade ao professor Luís Felipe Miguel
O Fórum Renova Andes vem a público declarar seu incondicional apoio e solidariedade ao professor Luís Felipe Miguel, da UnB, diante das ameaças advindas diretamente do ministro da educação no sentido de perseguir funcional e juridicamente uma atividade docente cotidiana.
É esperado que alguém beneficiado diretamente pelo impeachment, pois obteve o cargo após votar pela farsa armada no Congresso Nacional em 2016 contra o voto dos brasileiros, não se sinta à vontade em ver a palavra golpe, a qual descreve precisamente o que foi aquele triste episódio de nossa história. Mas o ministro deveria estar acostumado com tal conceito, pois se trata de alguém cujo partido só existe por ter sido relevante protagonista e vanguarda da ditadura anterior.
Um ministro membro de um governo que coloca o Exército Brasileiro para revistar mochilas de crianças negras e pobres no estado do Rio de Janeiro, que censura diretamente o desfile de uma escola de samba carioca e agora quer determinar o que pode ou não ser discutido nas salas de aula do País.
A universidade tem sido objeto de ataques constantes pela justiça de exceção e pelo governo golpista instalado em 2016. Desde então diversos docentes de todo o País buscam desvelar com metodologia e rigor científicos a dinâmica e as implicações desse triste episódio de nossa história política. O que vem ocorrendo com o professor Luis Felipe Miguel é apenas o prenúncio do que virá contra os todo e qualquer docente que ousar produzir conhecimento autônomo e crítico no Brasil.
Somente os que apoiaram, se beneficiam e/ou se omitiram diante do golpe querem negar sua existência ou ocultar a sua natureza. Por isso combatem a investigação científica, sua divulgação e o debate em ambiente democrático.
É nossa tarefa como movimento docente oferecer solidariedade e defender o professor Luís Felipe Miguel contra todo tipo de perseguição, seja jurídica, institucional ou midiática, uma defesa que é de todos nós, da Universidade, do ensino, da extensão e da pesquisa científica no Brasil.