Por Carlos Henrique Silva, CPT Nacional
Em meio às consequências da crise climática que afetaram mais fortemente a Amazônia em 2023, o ano de 2024 parece trazer perspectivas ainda mais difíceis para a vida das populações tradicionais e ribeirinhas. É o que acontece com as comunidades junto aos rios Madeira (em Rondônia) e Acre (no estado de mesmo nome), que estão percebendo a diminuição rápida dos níveis nos últimos meses, principalmente com o início do “verão amazônico”, como é chamado o período de escassez de chuvas e aumento nas temperaturas de junho a agosto.
O Rio Madeira, que teve recorde de cheia histórica em 30 de março, alcançando 19,74 metros de inundação (quase três metros acima da cota), chegou em junho a níveis preocupantes para especialistas e principalmente as famílias. Segundo o Boletim Hídrico do Governo do Estado de Rondônia, o nível caiu dos 4,55 metros no dia 17 para 4,09 metros na segunda-feira passada (24), menos da metade da medição registrada em 2023, quando o rio estava com 8,37 metros de profundidade. Se seguir essa tendência, o rio pode atingir a cota de escassez hídrica, abaixo de 1,70 metro.
A agricultora Maria de Fátima, presidente da associação da comunidade Terra Firme, em Porto Velho/RO, compartilha do sofrimento de 30 famílias residentes na localidade, que além da falta de água, vivenciam o aumento do calor. “A situação está alarmante, porque as comunidades dependem do rio pra se deslocar, se alimentar, pra tudo. E também não temos condição nenhuma de consumir a água nem os peixes do Rio Madeira, por causa da poluição do mercúrio dos garimpos.”
A solução da prefeitura para o acesso à água tem sido a perfuração de poços artesianos, uma medida que também encontra dificuldades para se concretizar. Depois de 16 anos de reivindicação e espera da população, os primeiros poços estão começando a ser perfurados em Terra Firme e também nas comunidades vizinhas de Papagaios e Santa Catarina, além dos distritos de Calama e Demarcação.
Na outra margem do rio Madeira, em Humaitá (AM), as comunidades ribeirinhas também têm sofrido com a estiagem. Sem contar com políticas públicas de fomento a produção, de direitos básicos, como saúde, educação, seguro para a pesca, além da falta de regularização do território, elas veem como única saída a extração do garimpo, o que traz impactos ambientais tanto em seu funcionamento quanto nas destruições das dragas realizadas pelos órgãos federais.
“O rio acaba morrendo do mesmo jeito, porque as explosões destroem tudo e também contaminam a água com os produtos químicos. Tem pessoas até com a saúde mental afetada, porque estão sem alternativa para sobreviver”, afirmam representantes das comunidades.
Estiagem deixa todos os municípios do Acre em emergência ambiental
Na mesma região, o estado do Acre sofre as consequências da crise climática apenas alguns meses após a cheia recorde que deixou milhares de famílias desabrigadas ou desalojadas, superando as expectativas e a estrutura mesmo daquelas que já conviviam com as enchentes. No sábado (29), o Rio Acre chegou a registrar 1,78 metro, um sinal dos extremos dos impactos das mudanças.
No último dia 11 de junho, o governo do Estado decretou situação de emergência ambiental em todos os 22 municípios do estado até 31 de dezembro. A Secretaria do Meio Ambiente (Sema) ficou com o encargo da coordenação e articulação interinstitucional dos órgãos e entidades estaduais, para a definição de estratégias de prevenção e de combate ao desmatamento e incêndios. Contudo, as comunidades dependem de outras ações concretas contra a poluição, que também tem atingido os cursos de água.
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Imgem: Alan Chaves / AFP