Quilombolas denunciam Suzano por uso de drones sem autorização

Comunidades do Sapê do Norte se sentem ameaçadas e com a privacidade invadida

Por Elaine Dal Gobbo, Século Diário

Representantes de comunidades quilombolas de Conceição da Barra, norte do Espírito Santo, registraram Boletim de Ocorrência (BO) contra a multinacional Suzano Papel e Celulose (ex-Fibria e ex-Aracruz Celulose) por utilização de drones na região. Conforme consta no BO, isso vem acontecendo há um pouco mais de dois meses, justamente quando a comunidade de Coxi iniciou a retomada do território. Os quilombolas denunciam que se sentem vigiados e ameaçados.

“A gente não tem privacidade nenhuma. Muitas vezes o drone está bem em cima das nossas casas, fazendo barulho. Incomoda muito. Além disso, por falta de banheiro em algumas casas, há pessoas que fazem as necessidades no mato. Temos medo de ter nossas imagens divulgadas”, diz a professora e agricultora Larissa Soares, da comunidade de Coxi. De acordo com ela, os drones sobrevoam principalmente as casas das lideranças das comunidades, o que interpretam como uma ameaça.

As comunidades destacam, ainda, que a Constituição Federal garante o direito à privacidade e intimidade, e a Convenção 169 da Organização Internacional Trabalho (OIT) o direito à consulta prévia. Os quilombolas relatam outras atitudes ameaçadoras por parte da Suzano. Larissa afirma que vigilantes da empresa costumam circular nas comunidades com carros e cães, abordam as pessoas, e fazem uma série de perguntas, como o que elas estão fazendo e se têm autorização, enquanto os quilombolas realizam atividades como o plantio.

Em alguns casos, como no último final de semana, os vigilantes chegaram a acionar a Polícia Militar (PM). Larissa relata que, na ocasião, um homem da comunidade de Coxi foi acusado por um vigilante da Suzano de arrancar mudas de eucalipto, quando, na verdade, eram brotações, ou seja, resíduos de eucaliptos já cortados, que a multinacional não utiliza, e os quilombolas aproveitam para fazer carvão. Ainda assim, um BO foi feito contra o quilombola.

Essa prática se repete há décadas no antigo Território do Sapê do Norte, formado ainda pelo município de São Mateus, que concentra a maior parte das comunidades quilombolas do Estado, com inúmeros casos de prisões nas últimas décadas, resultado da atuação das seguranças privadas, e da estratégia de criminalização dessas famílias.

O sobrevoo de drones no Sapê do Norte também não é novidade. Há registros de casos de utilização para pulverização de agrotóxico no plantio de eucalipto. Em julho de 2022, a comunidade Morro da Onça denunciou que um drone da Suzano lançou veneno sobre uma roça de mandioca e aipim que havia sido plantada recentemente, destruindo cerca de um hectare de plantios. “Ela fez essa pulverização numa área em que cortou eucalipto em fevereiro, março, e que quer replantar agora. É próximo de uma área de recuo para nós, mas que invadiu o recuo. Matou as plantas todas onde bateu o veneno”, relatou, na ocasião, uma das lideranças da comunidade, Josielson Gomes dos Santos.

O fato foi denunciado na reunião da Mesa de Resolução de Conflitos Fundiários, coordenada pela Secretaria de Estado de Direitos Humanos (SEDH). A gestão de Renato Casagrande (PSB), então, se comprometeu a notificar a Suzano para cumprir com as determinações da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que trata dos direitos de povos e comunidades tradicionais ao redor do mundo, nas operações de pulverizações aéreas de agrotóxicos em seus monocultivos de eucalipto. Entre as medidas que precisavam ser empreendidas, estava a comunicação prévia sobre as pulverizações e o diálogo sobre as formas mais seguras de aplicar os venenos, de forma a não prejudicar as comunidades.

Na reunião, também houve um comprometimento por parte da empresa de realizar os levantamentos necessários para indenizar a comunidade pelos danos com a lavoura. A Suzano refez o plantio de mandioca e houve um acordo entre as partes do pagamento de indenização por danos materiais em torno de R$ 5 mil, referente à estimativa de produção que seria colhida.

Imagem: Redes sociais

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