Um resgate da verdadeira história da escravidão negra. Este é o principal objetivo da Comissão da Verdade da Escravidão Negra no DF e Entorno, criada pelo Sindicato e que tomou posse nesta segunda-feira (9). São 35 integrantes, entre advogados, historiadores, sociólogos, jornalistas, educadores, filósofos, artistas, estudantes, militantes de direitos humanos e líderes religiosos cristãos e de matriz africana, dispostos a lutarem por reparações das injustiças sofridas por esse povo.
O presidente do Sindicato, Eduardo Araújo, garantiu total apoio à Comissão e observou que o trabalho proposto pelos seus integrantes ajudará a desmistificar o preconceito dentro da própria categoria. E ainda sugeriu a criação de uma revista com os dados coletados por meio de pesquisas e outras atividades desenvolvidas, nos moldes da edição especial da Extratos, uma coletânea do trabalho desenvolvido pela Comissão da Verdade sobre a Ditadura Militar.
Lucélia Aguiar, presidente da Comissão da Escravidão Negra, informou que será desenvolvido um trabalho de esclarecimento sobre a real história da escravidão ocorrida no DF, desde 1700 até 1960, e a busca de respostas que efetivem a inclusão do negro nos espaços sociais por meio de políticas públicas que venham a combater o genocídio da juventude negra, a sua inclusão nas universidades e no mercado de trabalho e garantir segurança para toda a população negra.
“Nosso objetivo principal é a reparação ao povo negro que foi escravizado após a falsa abolição que nos penaliza até hoje, com racismo institucional em que os negros não ocupam espaços do poder ou ensão sub-representados”, ressaltou Lucélia.
As áreas estabelecidas como de interesse para a pesquisa estão situadas em um raio de 300 km do centro de Brasília, compreendendo o Distrito Federal e municípios do estado de Goiás onde também estão localizadas 19 comunidades quilombolas reconhecidas pelo Governo Federal.
Trabalho de pesquisa
Mário Lisbôa, relator da Comissão, assinalou que ela é uma reprodução da iniciativa nacional. “Nós estamos tentando ir um pouco além com a experiência que se obteve da primeira comissão. Nós iremos captar o máximo possível de informações e dados sobre algumas questões básicas, como a posse da terra, do acesso ao trabalho, à saúde e à educação nessas comunidades”, apontou.
Segundo Lisbôa, a Comissão pretende aproveitar não só o que eles chamam de memória negra, que é a memória das comunidades remanescentes de quilombos, mas também a memória branca – instituições e cartórios — para resgatar o máximo possível a realidade que foi vivenciada pela região do DF e Entorno, dos séculos 18/19 até 1960.
“Nossa ideia é fazer um levantamento para, a partir disso, e se for o caso, instar judicialmente ou legalmente os órgãos ou entidades governamentais para tentar modificar um pouco a realidade que ainda é muito cruel para o povo negro”, complementou o relator da Comissão.
Etnias escravizadas
Após a realização de cinco reuniões, o trabalho da Comissão foi dividido em quatro grupos que receberam os nomes de etnias dos escravizados que povoaram a região do DF e Entorno. O primeiro, batizado de Angola, tratará dos levantamentos referentes às comunidades quilombolas; o segundo, Benguela, cuidará dos levantamentos das cidades fundadas no período colonial e no período pós-abolição; o terceiro, Cabinda, pesquisará os materiais bibliográficos referentes à região onde se estabeleceu o DF; e o quarto, Mina, tratará de questões jurídicas e de encaminhamentos a partir das referências dos demais grupos.
As informações obtidas deverão servir de base na atuação da Comissão no que diz respeito à responsabilização do Estado, de forma a facilitar a implementação de políticas públicas reparatórias, compensatórias ou afirmativas.
Os produtos finais serão a preparação de um relatório final de pesquisa e um seminário de apresentação dos resultados para as comunidades remanescentes dos quilombos pesquisados previstos para acontecer em novembro de 2016.
Entenda a criação da Comissão
Em novembro de 2014, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) criou a Comissão Nacional da Verdade sobre a Escravidão Negra no Brasil (CNVENB/CFOAB), para resgatar a história relativa ao período da escravidão e sua divulgação para a população em geral. Além da Comissão idealizada em âmbito nacional, a CNVENB no DF foi criada em 2015, com o objetivo de empreender um trabalho mais específico e local sobre a temática.
Por não ter sido convalidada pela nova diretoria da OAB empossada em janeiro deste ano, o Sindicato dos Bancários de Brasília tomou a iniciativa de criar a atual Comissão e convidou parte dos ex-membros da CNVENB/OAB, para garantir o avanço das ações da população negra.
Mariluce Fernandes, do Seeb Brasília, com Denise Porfírio, da Ascom/Comissão Negra do DF