Por Marco Weissheimer, no Sul21
Uma articulação de moradores de Porto Alegre, de cidades da Região Metropolitana e de representantes de movimentos ambientalistas e populares realizou, na manhã desta terça-feira (14), em Porto Alegre, um protesto contra o projeto de instalação de uma mina de carvão a céu aberto, em um território que abrange os municípios de Eldorado do Sul e Charqueadas, às margens do rio Jacuí. A manifestação foi realizada em frente ao Hotel Plaza São Rafael, no centro da capital, no momento em que iniciava o Seminário “Novos aproveitamentos para o carvão mineral do RS – Tecnologias inovadoras”, promovido pela Sociedade de Engenharia do Rio Grande do Sul (SERGS) com o objetivo de debater a implantação de um Pólo Carboquímico no Estado.
O projeto Mina Guaíba, da empresa Copelmi Mineração Ltda., pretende extrair, durante 30 anos, carvão mineral, areia e cascalho, em uma área localizada à beira do rio Jacuí, nos municípios de Eldorado do Sul e Charqueadas, a cerca de 20 quilômetros do centro de Porto Alegre. Segundo a empresa, a Mina Guaíba utilizará tecnologias de ponta para explorar a reserva de carvão mineral visando a geração de energia para o setor industrial, bem como sua transformação em gás de síntese e fertilizantes. O projeto, atualmente, está em processo de licenciamento junto à Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luiz Roessler (Fepam).
A mina de carvão que a Copelmi pretende abrir está localizada numa área de assentamentos de Reforma Agrária, produtores de arroz orgânico entre outros alimentos, e de um condomínio residencial tradicional da região, o Condomínio Guaíba. Segundo levantamento realizado pelo Movimento Pela Soberania Popular na Mineração (MAM) há pelo menos 88 assentamentos, localizados na Região Metropolitana de Porto Alegre e na área do Pampa, que podem ser atingidos diretamente por projetos de mineração.
O vice-presidente da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan), Heverton Lacerda, criticou a natureza do projeto e a falta de um debate amplo e transparente sobre as implicações do mesmo, junto à população que vive no entorno da área. “Quem está trazendo esse tipo de subdesenvolvimento para o Rio Grande tem interesse apenas no lucro. Não é um investimento aceitável quando já existem várias alternativas de energia limpa. Eles não estão se importando com a saúde da população nem com os sérios riscos ambientais que a mineração de carvão representa, ainda mais no caso da Mina Guaíba, que é uma ameaça direta à qualidade das águas do Jacuí e do Guaíba. O governo gaúcho, que busca inspiração nas façanhas de fora do Rio Grande do Sul, deveria se preocupar com casos como os de Mariana e Brumadinho”, afirmou.
Advogada especializada em Direito Ambiental, Patricia Silveira destacou o simbolismo da presença de vários grupos diferentes na manifestação desta terça. “Estou aqui com amigos meus que são moradores de Porto Alegre há pelo menos 45 anos. Estamos aqui nos manifestando contra o projeto Mina Guaíba em nome da proteção da água, não só para nós, mas para as futuras gerações, já que é um projeto que pretende atravessar décadas. Também estamos aqui em defesa da dignidade da pessoa humana, já que é um projeto que foi feito sem o conhecimento da população que pouco ou nada sabe a respeito dele”.
Patricia Silveira organizou um abaixo-assinado, que já conta com mais de duas mil assinaturas, contra a implantação da Mina Guaíba que foi entregue pelo ex-governador do Rio Grande do Sul, Jair Soares, ao atual governador Eduardo Leite (PSDB). “Continuamos recebendo assinaturas de apoio e a receptividade tem sido ótima, mostrando que a maioria da população não sabe nada sobre a mina de carvão que vai atingir diretamente suas vidas, podendo comprometer a água que milhões de pessoas bebem hoje”.
Além do abaixo-assinado, Patricia Silveira também encaminhou uma representação junto ao Ministério Público Estadual do Rio Grande do Sul contra o projeto. “Em verdade, o projeto Mina Guaíba vai ser uma atividade meio da atividade fim que é o polo carboquímico, o que significa dizer que o impacto total desse empreendimento não está sendo analisado, apenas o impacto parcial da mina, que já é enorme. Minha representação tem como base essa questão e pede a realização de uma audiência pública em Porto Alegre, não só em função do licenciamento ambiental da mina, mas também da repercussão ambiental da política governamental do carvão criada pela lei 1547”, assinala a advogada.
A ativista ambientalista e advogada Luciele Francisca de Souza manifestou preocupação com o impacto do projeto de mineração de carvão sobre o lençol freático da região e os rios Jacuí e Guaíba, bem como sobre a biodiversidade da região. Ela lembrou o Acordo de Paris para a redução da emissão de gases de efeito estufa que implica, entre outras coisas, uma redução significativa do uso de combustíveis fósseis. “O Rio Grande do Sul e o Brasil estão na contramão, pois a Copelmi já disse que pretende explorar essas terras até 2050. Nossa batalha também está relacionada às condições climáticas globais”, destacou.
A Fepam já publicou um edital para a realização de uma audiência pública, dia 27 de junho, em Eldorado do Sul, para debater o projeto de mineração de carvão da Copelmi. A audiência está marcada para iniciar às 18 horas, no ginásio da Escola Municipal de Ensino Fundamental David Riegel Neto. A articulação de grupos e movimentos que se opõe ao projeto quer que também seja realizada uma audiência pública em Porto Alegre, alegando que a população da capital também será impactada pelo mesmo.
—
Imagem: Manifestantes realizaram protesto em frente a hotel que sediou seminário sobre mineração de carvão. (Foto: Giulia Cassol/Sul21)