Intolerância política: crimes em série por causa de ideias

Pedro Calvi, da CDHM

Um estudo da Diretoria de Análise de Políticas Públicas da Fundação Getúlio Vargas, aponta que os comentários sobre agressões por motivação política geraram 2,7 milhões de postagens em redes sociais durante o segundo turno das últimas eleições, contra 1,1 milhão nos 30 dias anteriores ao pleito. São postagens que repercutem denúncias de agressões que circulam nas redes ou são notícias nos jornais.

Já o grupo de liberdade de informação Open Knowledge levantou informações sobre cerca de 70 ataques contra pessoas em um banco de dados chamado Vítimas da Intolerância. Na maioria dos casos, as vítimas são mulheres, LGBTs e negros.

O sociólogo e editor Haroldo Ceravolo identificou 120 ataques, incluindo 4 assassinatos, em um mapa violência política criado por ele desde o início de outubro. Os casos incluem vandalismo político, como vários relatos de suásticas pintados em prédios.

A gravidade da situação atual veio à tona com o assassinato o capoeirista Moa do Katendê, assassinado com 12 facadas em Salvador após uma discussão sobre os candidatos à Presidência.

São diversos casos já registrados por Delegacias, Ministério Público, imprensa, órgãos em defesa dos direitos humanos e sociedade civil. Alguns deles levaram à morte de pessoas que expressavam de forma livre e pacifica a manifestação de seus pensamentos.

“O elevado número de crimes por motivação política representa um atentado ao estado democrático de direito, eles inibem a livre expressão do pensamento em diversos segmentos da sociedade. Após as declarações verbais de alguns candidatos durante as eleições, esse tipo de crime tomou uma proporção incontrolável em todas as regiões do país”, alerta o presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (CDHM), Luiz Couto (PT/PB).

E é justamente para discutir essa situação e o que poderá acontecer se essa onda de violência persistir, que a CDHM promove na próxima quarta-feira (28), às 14h, no plenário 9, uma audiência pública.  

“As instituições democráticas, inclusive esta Câmara dos Deputados, não podem se render às forças que submetem a dignidade humana. É para  discutir medidas eficazes contra a agressão a direitos, mediante ofensas, discriminação, ameaças ou mesmo violência física, é estamos fazendo esse debate. Precisamos fortalecer nossa democracia”, afirma Luiz Couto.

Alguns casos de violência no período eleitoral   

Em São Paulo, uma mulher transexual foi assassinada no centro da capital do estado. No Rio de Janeiro, outra mulher trans foi atacada com barra de ferro no Rio de Janeiro com golpes na cabeça e no pescoço, além de chutes e socos pelo corpo. Nessas duas situações os agressores gritavam o nome de um candidato à Presidência da República.

Em Curitiba, o jornalista Guilherme Daldin, que vestia uma camiseta com a imagem do ex-presidente Lula, foi atropelado por um carro no centro da cidade. Também em Curitiba, um estudante recém-formado foi agredido na Universidade Federal do Paraná (UFPR) por usar um boné do MST.

Em Recife, uma jornalista do portal NE10 foi agredida e ameaçada de estupro quando deixava o local em que tinha acabado de votar.  Os agressores vestiam camisetas com a imagem do mesmo candidato à Presidência mencionado no caso das mulheres trans.

Em Manaus, o publicitário Eloi Capucho foi ameaçado de morte após uma discussão política.

Em Maceió,  Julyana Rezende Ramos Paiva foi agredida com um soco no rosto após declarar seu voto publicamente.

Audiência Pública

Devem participar da audiência pública, representantes da Defensoria Pública da União, Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, Ministério Público Eleitoral, Tribunal Superior Eleitoral, Conselho Nacional de Direitos Humanos e do Conselho Federal da OAB.

O que diz a Constituição

A Constituição Federal de 1988 prevê no artigo 5º que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”. Também garante, no mesmo dispositivo, que “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato” (inciso IV); e que “é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença” (inciso IX). A manifestação de pensamentos, mormente na seara política, pode se dar de modo individual ou coletivo. “Todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização ” (inciso XVI).

Ilustração: Dalton Soares / G1

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