Nota da ABA e sua Assessoria de Meio Ambiente em repúdio ao Programa de Revitalização da Indústria Mineral Brasileira

Associação Brasileira de Antropologia – ABA e sua Assessoria de Meio Ambiente

A ABA e sua Assessoria de Meio Ambiente repudiam as ações do Programa de Revitalização da Industria Mineral Brasileira, considerando o caráter excepcional e antidemocrático desta reforma proposta pela via de medidas provisórias, em função da ausência do debate sobre seus efeitos com organizações e movimentos da sociedade e, especialmente, com os povos e comunidades que sofrem os efeitos mais diretos das atividades produtivas do setor minero-extrativista.

Em cerimônia oficial no Palácio do Planalto realizada no dia 25/07/2017, foi lançado o Programa de Revitalização da Indústria Mineral Brasileira, ocasião em que foram assinadas pelo Presidente em exercício Michel Temer três medidas provisórias (MPs 789, 790 e 791) que visam facilitar a expansão das atividades de mineração no país. As medidas versam sobre a criação da Agência Nacional de Mineração (ANM), a modificação do Código de Mineração e a revisão da legislação que trata da Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM). Sob o argumento de que os marcos legais e administrativos hoje impedem o dinamismo do setor e a atração de novos investimentos, o Governo brasileiro propõe a revisão do marco regulatório da mineração, sem considerar os efeitos destas mudanças sobre os territórios e os povos que habitam as regiões das jazidas, as áreas próximas às indústrias de beneficiamento, as zonas portuárias, as áreas de minerodutos ou as margens das linhas de trem que transportam o minério.

As três medidas mencionadas visam flexibilizar a legislação para atrair novos empreendimentos da indústria extrativista. Sob o argumento dos “benefícios” que estes empreendimentos podem gerar para a Economia, retoma-se o debate sobre o marco regulatório da mineração a uma posição que já vinha sendo questionada pelos movimentos sociais, representantes da sociedade civil e pesquisadores, desde 2013, quando surgiu a pauta da reforma do Código de Mineração (por meio do envio ao Congresso Nacional do Projeto de Lei 5807/2013). Dentre as mudanças propostas incluía-se a autorização para mineração em Unidades de Conservação (UC) de Uso Sustentável (o que poderia também representar um sério obstáculo à oficialização de novas UCs em Terras Indígenas e Quilombolas), a desconsideração de salvaguardas para as comunidades afetadas (considerando que seria atribuição da Agência Nacional de Mineração regulamentar o conceito de “comunidades impactadas”), bem como a criação de um dispositivo associado ao “relevante interesse da mineração”, que implicaria a primazia desta atividade frente a outros interesses individuais e coletivos.

As modificações propostas pelo Programa de Revitalização da Indústria Mineral Brasileira na regulação das atividades de mineração levará ao acirramento das desigualdades e injustiças sociais de acesso ao território e aos bens comuns, e ao quadro de perene violação aos direitos humanos, como evidenciam pesquisas antropológicas recentes, assim como as denúncias envolvendo empresas brasileiras e internacionais em diversas regiões do país: no Pará e no Maranhão, nas áreas do Projeto Ferro Carajás S11D da empresa Vale; em Minas Gerais, município de Conceição do Mato Dentro, nas áreas do Projeto Minas-Rio da empresa Anglo American; na Bahia, nas áreas de exploração do urânio em Caetité pela empresa estatal Indústrias Nucleares do Brasil (INB); nas áreas de extração de bauxita no Pará, em Oriximiná e Juriti, pelas empresas Mineração Rio do Norte e Alcoa – para citar apenas alguns dos 14 casos nos território brasileiro envolvendo graves cenários de violação de direitos que foram denunciados por um conjunto de organizações e movimentos sociais em junho de 2016 à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA). Soma-se a estes cenários a constatação evidente de que a flexibilização da legislação pode resultar em um menor controle sobre os riscos de desastres, como vimos ocorrer no caso do rompimento da barragem de Fundão, de propriedade da SAMARCO/VALE/BHP BILLINTON em Mariana – MG, o maior desastre mundial da mineração em volume rompido de lama.

As investidas no avanço produtivo da mineração serão responsáveis pela inauguração de novas “zonas de sacrifício” que ameaçam os territórios dos povos e comunidades tradicionais, camponeses, indígenas, quilombolas, ribeirinhos, pescadores, já em muito ameaçados pelos descaminhos da política brasileira no último ano, com ações que constantemente desrespeitam os acordos estabelecidos na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), representando inúmeros retrocessos ao reconhecimento de direitos. A expansão da fronteira extrativista também representará uma forte ameaça às ações de conservação ambiental, especialmente na região amazônica, onde os investimentos da indústria minero-extrativa se farão expressivos.

Brasília, 02 de agosto de 2017.

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