Por Associação União das Aldeias Apinajé-Pempxà
No último sábado, dia 23/07/16 realizamos na aldeia São José na T.I. Apinajé reunião na qual tratamos sobre assuntos internos e sobre as políticas públicas de governo, especialmente sobre o papel constitucional da Fundação Nacional do Índio-FUNAI. A reunião contou com as presenças de estudantes, professores, caciques, Agentes Indígenas de Saúde-AIS, mulheres, idosos (as), membros conselheiros da União das Aldeias Apinajé-Pempxà e demais lideranças.
Durante todo o dia debatemos com foco nas questões territoriais, ambientais e sociais do povo Apinajé, com reflexões e analise críticas sobre a responsabilidade do Governo Federal de fiscalizar proteger as terras indígenas que são bens e patrimônio da União.
No final da tarde encerramos as conversas com alguns encaminhamentos:
1) a próxima Assembleia extraordinária da União das Aldeias Apinajé-Pempxà será realizada em agosto ou setembro na aldeia São José, em data à ser confirmada;
2) no dia 03 de agosto próximo participaremos de reunião no MPF-AGA em Araguaína para debater assuntos de interesse do povo Apinajé;
3) que na próxima Assembleia serão tratados sobre as mudanças na diretoria da União das Aldeias Apinajé-Pempxà, bem como será efetivada a posse do novo presidente dessa organização;
4) na próxima Assembleia também serão discutidos com as presenças de todos os caciques e lideranças, do MPF-AGA e da FUNAI sobre a entrada de evangélicos e outras seitas religiosas nas aldeias Apinajé;
5) finalmente elaboramos um manifesto de apoio à FUNAI e cobrando do Governo Federal o cumprimentos de preceitos e dispositivos constitucionais que declaram a responsabilidade e o dever do Estado brasileiro de fiscalizar e proteger os territórios indígenas.
Leia o Manifesto na íntegra abaixo:
MANIFESTO DO POVO APINAJÉ EM DEFESA DA FUNÇÃO CONSTITUCIONAL DA FUNAI
Nós caciques e lideranças Apinajé somando mais de 50 pessoas reunidas no dia 23/07/2016 na aldeia São José, TI Apinajé, município de Tocantinópolis-TO para discutir nossas questões internas e também tratar sobre a conjuntura do atual governo e a implementação da Política Indigenista no Brasil, viemos à público manifestar extrema preocupação com a situação de total inoperância e abandono da Fundação Nacional do Índio-FUNAI/sede, de suas CRs e CTLs, que de forma geral encontram se em condições precárias e sucateadas dificultando e impedindo a efetivação das demarcações, a fiscalização e a proteção dos territórios indígenas conforme determina os Arts 231 e 232 da Constituição Federal do Brasil.
Repudiamos com veemência essa campanha infame dos setores conservadores que atuam no âmbito dos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário contra nossos direitos constitucionais. Percebemos que muitos parlamentares ligados as bancadas ruralistas e evangélicas estão agindo (nas sombras) de forma articulada e agressiva dentro do parlamento brasileiro pautando e discutindo propostas com a finalidade de mudar a constituição para retirar nossos direitos sociais, culturais e ambientais. A Proposta de Emenda à Constituição PEC 215/2000 significa a real materialização desse retrocesso.
Denunciamos que a tramitação dessa Proposta de Emenda à Constituição PEC 215/2000 na Câmara dos Deputados tem sido um fator determinante para agravamento dos conflitos no campo e o responsável pelo aumento dos assassinatos de lideranças indígenas em áreas de conflitos. Lamentavelmente o Governo Federal através do MJ e da Polícia Federal, Força Nacional e das Forças Armadas não conseguem impedir essa onda de ataques e massacres contra as lideranças indígenas que lutam por direitos humanos, pela regularização fundiária e garantias territoriais no País.
Assim contrariando os preceitos de um Estado pluriétnico, multicultural, ambiental e biologicamente diverso, os seguidos governos tem privilegiado um único setor dito “produtivo”, que na realidade é o maior responsável pelo desmatamento da floresta Amazônica, do Cerrado e da Mata Atlântica, o setor ruralista gera poucos empregos, promove expulsão de famílias do campo para às cidades, sendo também responsável pela grilagem de terras, trabalho escravo e provocador de violência no meio rural. Esses fatos nunca são divulgados, ou são propositalmente manipulados e/ou ocultados pela grande mídia financiada pelo agro.
Os recorrentes despejos violentos de famílias e as execuções de lideranças Guarani Kaiowá no Estado de Mato Grosso do Sul; realidade que envergonha a sociedade brasileira perante a opinião pública internacional, também não são noticiadas pelas grandes redes. É inaceitável que setores ruralista estejam utilizando se de expedientes midiáticos como as CPIs da FUNAI e do INCRA para tentar criar um clima de constrangimentos, intimidações e ameaças, jogando a opinião pública contra os servidores da FUNAI e do INCRA, contra as organizações indígenas e as ONGS ambientalistas e indigenistas. Mais uma vez criticamos essa postura omissa e irresponsável do Governo brasileiro que de forma conivente, submissa e entreguista continua cedendo às pressões do agronegócio, das madeireiras, das mineradoras e de outros invasores que pretendem continuar usurpando e alienando nossos territórios para explorar economicamente de maneira predatória e criminosa nosso patrimônio ambiental e cultural.
Percebemos que esse Governo interino do Michel Temer continua priorizando e seguindo religiosamente a pauta do setor ruralista; composta por grandes fazendeiros e empresários, impondo à FUNAI/sede, as CRs e CTLs essa situação caótica de total abandono e sucateamento; com cortes de recursos e demissão de servidores. Essa atitude deixa claro que esse governo está intimamente alinhado e comprometido com os valores, o pensamento e as práticas do setor ruralista, cujo objetivo imediato é enfraquecer e esvaziar totalmente o órgão indigenista, deixar as TIs desprotegidas e as comunidades na mira dos capangas do agronegócio.
Diante dessa situação de descaso e omissão governamental declaramos que estamos nos organizando para efetivar por nossa conta e risco o Monitoramento e a Proteção de nosso território demarcado e regularizado, e que em razão dessa situação de conflito e ameaças constantes contra nosso povo, se algum confronto violento que resulte em sequelas físicas e perdas de vidas humanas vier ocorrer, o Estado brasileiro será mais uma vez formalmente denunciado nos Tribunais Internacionais de defesa dos Direitos Humanos e na ONU. Diante dos fatos expostos manifestamos nos seguintes termos:
1) que o governo brasileiro através do MJ-FUNAI/sede adotem as providências orçamentárias e condições estruturais para que as CR-Araguaia/Tocantins e CTL/Tocantinópolis efetivem a fiscalização e proteção da Terra Indígena Apinajé, que encontra se parcialmente invadida;
2) que sejam adotadas pela FUNAI/sede, CR-Araguaia/Tocantins de Palmas e CTL de Tocantinópolis medidas administrativas e judiciais para retomada do processo de regularização fundiária da área Apinajé II, no município de Tocantinópolis, afetada por desmatamento irregular para plantio de eucaliptos;
3) que o Ministro Teori Zavascki relator da ADI 5312 ajuizada pelo PGR-Procurador Geral da República Dr. Rodrigo Janot que questiona a constitucionalidade da Lei 2.713/2013 do Estado do Tocantins, leve a referida matéria ao plenário do STF para julgamento e decisão definitiva por parte da Suprema Corte;
4) que sejam acatadas e cumpridas pelas autoridades brasileiras as ordens e regramentos do direito internacional preconizados na Convenção 169 da OIT e na Declaração do ONU sobre os direitos dos Povos Indígenas das quais o Brasil é signatário;
5) que o IBAMA/Prev/Fogo inicie imediatamente na T.I. Apinajé ações de prevenção e combate aos incêndios nas florestas e cerrado, que no momento estão se alastrando na Terra Apinajé ameaçando as aldeias;
6) que o Procurador da República Dr. Felipe Torres do MPF-AGA no município de Araguaína adote medidas judiciais para impedir a retomada de desmatamentos no entorno desta T.I. até que seja julgada a ADI 5312 ajuizada pelo PGR;
7) que nossas organizações e comunidades Apinajé sejam previamente informadas e consultadas pelos empreendedores interessados quando se pretender implantar qualquer projeto que afete nosso território e aldeias;
8) que não concordamos com o relaxamento e flexibilização das Leis e regras para licenciamentos ambientais de projetos e empreendimentos que irão afetar nossos territórios;
9) que é inaceitável a proposta de extinção do Programa Mais Médicos, pedimos pela manutenção desses profissionais de saúde que atuam nas aldeias;
10) que não aceitamos a privatização da saúde indígena, considerando a saúde como um direito fundamental do cidadão e um dever do Estado, também não concordamos com sua municipalização.
Terra indígena Apinajé, 23 de julho de 2016
Associação União das Aldeias Apinajé-Pempxà
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Imagem: Plenária de reunião de caciques e lideranças Apinajé na aldeia São José. (foto: Antonio Veríssimo. Julho de 2016)